Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

20  02 2009

Trânsito

Em Luanda o trânsito é caótico, e poucos respeitam o código, no entanto, os semáforos são sagrados e parece que os sinais para abrandar ou parar com a mão também, ao contrário das lâmpadas de STOP. Passadeiras são apenas decoração, excepto quando alguém pára com os quatro piscas, para uma criança atravessar.

Um polícia comanda o trânsito de um lado da avenida e manda os carros avançar no preciso momento em que os do outro lado têm o semáforo verde. Como os segundos não conseguem ver o sinaleiro, gera-se o caos. Pelo meio costura um candongueiro, imune à confusão.

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Pode ser que se desviem

Na rotunda, quem vira à esquerda encosta-se à direita, para ultrapassar os que se encostaram à esquerda e pretendem virar à direita. Os motociclos e ciclomotores circulam em todos os sentidos, incluíndo os diagonais, só na roda traseira e com irritantes travões chiadores. Pelo meio há peões, que se vão abrigando destes kamikazes de duas rodas entre os pára-choques dos carros que avançam metro a metro.

Um buraco mais fundo embaraça o trânsito nos dois sentidos. O que apanha o buraco e o que apanha os carros que dele se desviam.

Nos cruzamentos nunca se deixa um espacinho para os que cruzam a estrada. Se o fazem, é certo e sabido que depois ninguém deixa entrar. Lixo-te antes que me lixes a mim. Lei da selva.

Se há um acidente, pequeno ou grande, todo o quarteirão pára. Dezenas de pessoas gritam, exaltadas. À volta do acidente, todos saem dos carros. Fazem um coro e acusam um e outro condutores de ser aselhas, assassinos e filhos de empresárias em nome individual. Prometem-se pagamentos de arranjos, enxertos de porrada, feitiços de queda de cabelo ou impotência. Depois descobre-se que, afinal, não há danos. Seguem todos a sua vida, como se nada se tivesse passado. O coro de buzinas que já enchia mais o ar que os gases de escape dos carros que não desligaram o motor (quase todos) vai esmorecendo à medida que se começa a andar.

A buzina é usada quase como comprovativo de funcionamento do motor. Se está a andar, tem de buzinar. É assim que se distingue os carros apodrecidos que andam dos apodrecidos que já não andam.

Meia-hora depois, chego ao escritório… Tive sorte. Podiam ter sido duas horas. À tarde tenho uma outra dose pela frente.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

6 respostas a “Trânsito”

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  1. Pis é. Na Luanda que eu conheci, não havia engarrafamentos. Nessa altura, durante o percurso entre a Maianga e o Aeroporto, apenas nos cruzávamos com pouco mais de meia dúzia de carros.
    Outros tempos.

  2. É por estas e por outras que eu poria a afirmação ao contrário: As outras províncias são Angola, Luanda é só (má) paisagem 😉
    Paciência…

  3. Desejo-te melhor sorte no regresso a casa.

  4. Tchuss,
    can you give here something about angolan railways?
    Many thanks.

  5. What angolan railways?
    Trains stopped circulating in 1975, after the independence. They are rebuilding the network, but it will take a few years until everything is running again.

  6. Caro Afonso,

    Muito boa noite.

    Parabéns por este artigo.

    Como diria o outro, é só rir !!!!!

    Uma experiência dessas é digna de um filme cómico ao
    estilo de Bud Spencer .

    Um abraço
    José Vila Santa

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