Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

14  01 2010

O que deixamos para trás

Por ter vivido alguns meses numa terra onde tantos deixaram vidas inteiras para trás e todos os dias me cruzar com marcas desse tempo e dessas pessoas, cada vez mais me interrogo acerca da marca que cada um deixa nesta nossa curta existência.

Jogo em Monsaraz
Ainda se sabe quem traçou este jogo, mas acabará por ser anónimo

Apaixonei-me pelas ruínas pequenas e grandes, mas mais pelas pequenas, que são ofuscadas pelas outras e por isso ainda mais esquecidas. Um letreiro desactualizado, riscos fundos gravados num banco ou simplesmente uma caixilharia velha fazem-me pensar em quem tocou aquele objecto, nas mãos agora anónimas que o moldaram, provavelmente sem saber que seria a sua marca no mundo depois do corpo e da memória desapareceram.

Tabacaria Progresso
Letreiro abandonado

É talvez por isso que me custa assistir a demolições de casas velhas e ver as marcas nas paredes deixadas pelas rotinas de quem lá habitou. Compreendo como se chegou áquele ponto e compreendo porque razão é inevitável, mas cá dentro sinto sempre um nó apertado, se calhar por ainda não saber bem a marca que deixarei.

Ruínas da Vila Maria
Quem morou aqui?

Bem vistas as coisas, não é de agora que me preocupo com isto. O tempo que dedico ao Aerograma obriga-me a procurar respostas (ou mais perguntas) para explicar o que vejo e sinto e muitas dessas perguntas são as que me perseguem há anos. Hão-de me perseguir até as conseguir responder mas, pelo que fui aprendendo pelo caminho, não são dúvidas originais.

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

4 respostas a “O que deixamos para trás”

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  1. De facto, não são dúvidas originais mas são tão legítimas que eu próprio também as costumo ter.
    Abraço

  2. Talvez não caia tudo em ruinas, porque de tudo o que se viveu, de Cabinda ao Cunene, parece que vai ficar um palop.

    E a memória da vida fabulosa que todos, quero dizer, todos, viveram um dia nessa cidade, como não pode ser representada ao vivo, morrerá quando os que a viveram forem desaparecendo.

  3. Será que não é possível saber o nome da rua e bairro da tabacaria?

  4. Esta tabacaria ficava numa rua perto do Hotel Presidente, não sei exactamente qual. Na outra esquina fica um Bingo que me parece abandonado.

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