Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

22  03 2010

Imortais desorientados

Um dos fenómenos mais intrigantes do trânsito de Luanda são as motinhas que circulam por todos os buracos e sentidos. É frequente ver os sinaleiros desviarem-se de motas que seguem pela rua em que acabaram de mandar parar o trânsito. Poderia parecer uma situação extraordinária, mas tanto para o polícia como para o motociclista apenas foi mais um momento de normalidade. A impunidade com que desrespeitam as mais elementares regras de trânsito e autoridades só deixa os estrangeiros estupefactos.

Uma regra empírica diz que o tamanho da mota é proporcional à consciência do condutor. Os condutores dos ciclomotores são a prova. As pequenas aceleras, já de si irritantes com os seus motores estridentes conduzidas aos arranques e de dedo na buzina, são o veículo preferido dos condutores mais inconscientes, aqueles que circulam só na roda de trás nos passeios, a alta velocidade em contramão, ou que se atiram pelo meio dos carros sem medir as distâncias. Aliás, graças a este sentido de invulnerabilidade já ganharam um nome apropriado.

Candongueiro «Advogado do vinho»
Outro perigo

Característica distintiva destes condutores é o seu aparente desconhecimento do destino ou percurso, embora um fraco sentido de orientação seja um dos requisitos para poder conduzir a acelera, tal como a incapacidade de cumprir regras de trânsito, um polegar sobredesenvolvido para aplicar no botão da buzina e um tique nervoso no punho direito para andar sempre a dar aceleradelas. Nos outros veículos de duas rodas não é um fenómeno tão evidente, mas não consigo explicar porque razão percorrem uma avenida inteira para, quase no final, fazer inversão de marcha pelo meio dos carros e voltar para trás, como quem se lembrou que afinal deixou a carteira em casa.

Não deverá ser para fugir ao trânsito nem para tomar um atalho, porque trânsito nunca apanham e atalhos tomam-se nos cruzamentos. Talvez se percam pelo caminho, embalados pelas buzinadelas ritmadas e só dêem por isso muito depois de passarem o destino. Até que se consiga explicar isto, estamos sujeitos a dar de cara com uma motinha atravessada na estrada porque foi ali precisamente que o condutor se lembrou que para o outro lado é que era bom. Já não bastavam as m’baias dos candongueiros.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

Uma resposta a “Imortais desorientados”

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  1. Claramente andam à procura da próxima vítima. Foi assim que nos assaltaram, e foi por ter reconhecido o método e as intenções que conseguimos evitar que uma senhora fosse assaltada da mesma maneira, uns meses depois.

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