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21  12 2010

O jardim dos candeeiros

Nos dias de Inverno, sempre que olho pela janela e vejo as luzes amarelas dos candeeiros a piscar por entre os ramos desfolhados dos choupos, lembro-me do nome com que se apelidou o jardim Felício Loureiro – O Jardim dos Candeeiros.

Ao longo de, pelo menos, vinte e quatro anos, o espaço entre a Avenida Eng.º Duarte Pacheco e o Rio Jamor foi local de fingimento de promessas eleitorais. A cada quatro anos, no mês anterior às eleições autárquicas, máquinas vinham cortar os canaviais, abrir caminhos e valas. Certa vez, colocaram lancis ao longo do rio, demarcando talhões de formas estranhas. Como sempre, na semana a seguir à contagem dos votos, homens e máquinas abandonavam a obra, para só regressarem no final do mandato. Os caminhos que os lancis deveriam limitar nunca chegaram a ser feitos.

Nas eleições seguintes, repetiram o corte de canaviais e abertura de valas, contornando, sem grandes preocupações, os lancis que se estendiam no  terreno. Plantaram largas dezenas de candeeiros verdes, a imitar ferro fundido, num terreno que pouco mais tinha que um qualquer baldio. A poucos dias da abertura das urnas, acenderam-nos todos com pompa e circunstância. Queluz tinha, finalmente, um jardim digno.

Mas as eleições foram-se e os operários também. Ficaram os candeeiros a iluminar as canas e os cardos por quatro anos. O ridículo de ter dezenas de candeeiros ao longo do rio a servir de testemunho a uma promessa eleitoral não cumprida e também de desperdício de dinheiros públicos, acabou por convencer alguém a concluir a obra. Cortaram as seis velhas oliveiras e fizeram novos caminhos, desta feita até com bancos e bebedouros. O projecto não foi dos melhores, por falta de ligação aos caminhos existentes, mas o jardim fez-se.

Jardim dos candeeiros
Jardim dos candeeiros

Mais tarde, com os ensaios de sementes a abandonarem definitivamente os terrenos ao lado dos estábulos do Palácio, o jardim foi ampliado, e mais candeeiros começaram a encher a paisagem. Durante os primeiros anos, também estes iluminaram apenas a relva seca que não sobreviveu à falta de sistema de rega. Esse esperou pelas eleições seguintes.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

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