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22  02 2012

Cursiva e gótica

Tal como hoje se aprende Inglês desde a escola primária por se achar importante, no passado aprendiam-se outras coisas que se achavam fazer parte de uma boa instrução para a vida. Algumas cairam no esquecimento por já não fazerem sentido nos dias de hoje e outras apenas porque não há tempo para ensinar tudo.

Quando aprendi a escrever, a única caligrafia ensinada era a cursiva. Gerações anteriores à minha aprenderam esta e, mais tarde, também a caligrafia gótica nas escolas técnica comerciais, por exemplo. Esta era mais complicada, mas adequada a documentos oficiais e essencial para quem almejava trabalhar numa repartição pública ou conservatória, entre outras. Por ter sido posta de parte há décadas, as poucas pessoas que conheço ainda capazes de escrever com relativa desenvoltura são quase todas octogenárias.

Ao contrário da cursiva, a caligrafia gótica implica que cada letra seja desenhada traço a traço, com linhas angulosas que não terminam onde começa a seguinte. Quase sempre se decora a ordem de cada traço para que cada letra saia perfeita. É um trabalho de paciência que requer mais atenção do que os rabiscos do cursivo onde uma aproximação da letra é o suficiente.

À medida que o conhecimento se foi perdendo, a caligrafia gótica no dia-a-dia entrou em extinção. E, como só se sente falta do que se conhece, ninguém se apercebeu de que desapareceu. Actualmente quase só no ecrã do computador se vê e são muito poucos os que a conseguem desenhar com naturalidade.

No entanto, o facto de não se saber como se desenha não quer dizer que tenha deixado de existir. Na Maternidade Alfredo da Costa descobri um resquício da época em que a caligrafia gótica fazia parte da vida. Para identificar as fechaduras de vários armários foram coladas etiquetas com estas letras mais trabalhosas. Passados muitos anos e muitas obras de adaptação do edifício, os armários continuam a uso e as etiquetas também.

Caligrafia gótica
Caligrafia gótica

Um pormenor ainda mais curioso foi descobrir que os armários foram pintados recentemente, mas quem o fez teve o cuidado de cobrir as etiquetas com fita para que não se perdesse a letrinha tão bem desenhada. Ao pintor, ter-lhe-ia sido muito mais fácil pintar tudo a eito e colar novas etiquetas, mas optou por preservar um bocadinho da memória do edifício.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

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