Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

30  08 2008

PLOC

No gabinete que partilho com alguns colegas costumamos ter umas visitas inesperadas.

Usam capote castanho, têm seis patas e duas longas antenas. Às vezes fazem a manutenção a impressoras, como já assisti.

As baratas, todas com um ar lustroso e saudável, aparecem sem avisar de um pequeno respiradouro atrás da minha cadeira. Se fossem mais educadas, davam-me tempo para arranjar um pouco a sala, compôr os bibelots e ter chá e bolinhos à espera.

Como não são os visitantes mais desejáveis, quanto mais depressa se forem embora, melhor. Os meus colegas estão divididos quanto à maneira mais eficaz de correr com elas. Uns preferem praticar futebarata ou baratobol, imaginando as escadas como uma baliza. Outros são adeptos da pisadela técnica, de mais difícil domínio. Se se pisar com demasiada força, a barata fica esborrachada e liberta um aroma que lembra… bem, cheira a barata esborrachada. Se se pisar com pouca força, a barata diz que não é nada com ela e continua a fazer o que fazia antes.

Pessoalmente, sou adepto da pisadela técnica. Se bem aplicada, ainda se pode praticar futebarata sem o aborrecimento de ter uma bola que resolver fugir de nós. Para além do mais, a barata do futebarata acaba por ir perdendo peças no decorrer do jogo. Passa a ser preciso varrer o corredor todo em vez de apanhar um só cadáver.

Por outro lado, às vezes sinto que jogamos deslealmente. O chão é de mosaicos e as baratas surpreendidas em flagrante delito têm uma certa dificuldade em arrancar. Ficam uns instantes a patinar, dando às seis patas sem nunca sair do sítio. É o tempo suficiente para levarem uma pisadela ou um pontapé.

A segunda razão que me leva a preferir a pisadela técnica é o ruído que fazem quando se lhes dá com a sola do sapato.

PLOC!

É quase musical.

Bem sei que a barata não acha piada nenhuma, mas, condenada como estava, não tem grande voto na matéria. Para que a sua morte não seja em vão, apreciemos as qualidades estéticas do som produzido.

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

5 respostas a “PLOC”

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  1. Já podes acrescentar ao teu curriculo a prática de duas novas modalidades desportivas: baratabol e futebarata. Podes ainda referir a tua vasta e comprovada experiência em pidelas técnicas, das quais se obtém, depois de um Ploc, a matéria prima para praticar as ditas modalidades desportivas.
    Engenheiros!!!!

  2. Tentando imaginar a emoção do teu novo desporto, em vez de pisadelas escrevi “pidelas”. Consultei o dicionário, com a secreta esperança de ter criado uma expressão nova e interessante, mas a palavra não existe, oh!
    Burro velho não aprende línguas, mas não é por ser velho…
    PLOC! PLOC! PLOC!

  3. Eu prefiro o futebarata. Tirar as medidas ao objecto, notar aquela mudança assustada de trajectória (imagino que, pela cabeça da barata, passe qualquer coisa como «estou lixada…»), levantar o pé direito bem atrás, aplicar uma biqueirada certeira, ver a carapaça do sextúpede deslizar pelo chão, e avaliar a “olhómetro” se conseguimos bater o record de distância… Ah… chega a ser quase poético.

  4. ” A barata diz que tem sapatinhos de veludo é mentira da barata ela tem o pé peludo…”
    Lembrei-me desta musiquita para crianças… por Angola as baratas começam por ser vistas às peças e esmigalhadas e são divertimento para 3 crescidos na Ingombota.
    Sucesso no novo desporto… PLOC!

  5. já pensaram em amestrá-las? assim já podiam jogar futebarata de 5…

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