Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

20  12 2009

Central das Mabubas

Depois de algumas visitas à barragem das Mabubas, resolvi informar-me melhor acerca da situação das minas do outro lado. No quartel disseram-me que a situação não era tão negra quanto tinha pintado o polícia na primeira visita.

Tanque russo
A guardar a barragem

O passeio na margem esquerda do rio é muito mais agradável. Por alguma razão, quando se construiu a barragem fez-se também um miradouro para ver a albufeira e a povoação.

Miradouro
O miradouro

seguindo paralelamente ao rio há um caminho que liga a casa dos filtros às câmaras de equilíbrio de pressão antes dos geradores. Lá em baixo correm os dois grandes tubos octogonais que levavam água à central eléctrica.

Condutas de abastecimento à central
O caminho da água

Há muito que a água deixou de correr nas condutas. A guerra e a incúria encarregaram-se disso. Hoje servem de mesa para os grupos de turistas que vão visitar a barragem ao Domingo e resolver fazer uma patuscada à beira-rio.

Tubo rebentado
Sabotagem

O caminho reparado recentemente por uma máquina de rastos está juncado de maços de tabaco chinês, com marcas traduzidas para Inglês, talvez para lhes dar um ar mais internacional. Tabaco Dupla Felicidade ou Dragão Dourado tem mais charme que tabaco de linha branca. Sem precisar de imaginar muito, adivinhamos que o empreiteiro escolhido para esta obra é o novo parceiro oriental de Angola.

Central das Mabubas
Arqueologia industrial

Chega-se à central pelas traseiras, de onde podemos ver a destruição que a guerra civil causou. O telhado de vidro da casa dos geradores, todas as janelas, os isoladores dos cabos de média tensão que abasteciam o quartel na margem oposta e todas as paredes apresentam cicatrizes de balas de vários calibres. Para além das paredes, quase nada ficou inteiro.

Ruínas
Marcas da guerra

O parque de alta tensão fica do lado oposto do edifício. Lá, uma máquina vai amontoando a sucata que alguns trabalhadores retiram da central. Tratam com especial cuidado os núcleos dos geradores, que, literalmente, valem o seu peso em cobre. Peço autorização para fotografar ao capataz. Não falo Mandarim nem Cantonês, ele não fala Português, mas arranha Inglês e, à mistura com alguns gestos e acenos de cabeça aponta-me na direcção pretendida com um sorriso.

Interior da central
Destruição

Descontando as actividades de desmantelamento das máquinas e turbinas, o interior da casa dos geradores parece ter sido o palco de uma batalha sem quartel. Se do lado de fora havia muitos buracos de bala, aqui parece faltar espaço onde fazer mais um.

Chapa característica Westinghouse
Igual a este havia mais três

No piso inferior, sombras e silhuetas iluminadas pelos maçaricos vão dançando enquanto as turbinas são cortadas em pedaços mais pequenos. De vez em quando vemos alguém pousar a máscara e acender um cigarro. Pelos buracos conseguimos espreitar mais um pedaço de arqueologia industrial que desaparece.

As boas notícias são que a central está a ser recuperada, depois de muitos anos de abandono. Ainda não há previsão para a sua entrada em funcionamento, porque há muito para arranjar. Novas turbinas e transformadores tratam da parte eléctrica. Reparar o túnel de alimentação e a casa dos filtros também não deve ser uma operação demorada, mas voltar a pôr as comportas a funcionar e encher a albufeira até aos níveis mínimos, será a parte complicada.

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

20 respostas a “Central das Mabubas”

Nota: Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados.
  1. Meu caro amigo
    Parece que lhe ficou um qualquer gostinho pelas Mabubas. Pelo menos voltou a fazer esta viagem a um lugar que preenche um cantinho das minhas memórias passadas.
    Fico feliz por verificar que, finalmente, começam a ser dados os primeiros passos para a recuperação de uma estrutura fundamental para o desenvolvimento do país.
    Finalmente começam a tratar das feridas, embora as fotografias mostram que se trata mais da remoção de um cadáver.
    Sabe meu amigo, as ruínas que vejo, fazem doer.
    É que ainda me lembro de cada cantinho: o miradouro, a conduta da água, o edifício da central, as águas que se aquietavam após passarem pelo turbilhão das comportas … tudo.
    Todos esses espaços resplandeciam, funcionavam. Comparando com o que vejo, diria que na altura, se calhar, estavam envernizados, brilhantes. As turbinas rodavam, produziam energia.
    Por desporto ou para compor um petisco, pescava-se bom peixe, quer na albufeira quer a jusante do paredão.
    Espero que a tecnologia consiga resolver o problema das comportas e que finalmente a albufeira se encha.
    Fico à espera de convite para a inauguração …lol.

  2. Acho que o Afonso nos está a querer aconchegar a nostalgia depois de ler tudo o que vimos escrevendo sobre as nossas memórias de Angola.
    Pela minha parte o meu obrigado.
    Como diz o Cardoso, dói. Mas também cura um pouco da saudade que não se desvanece.
    Quanto a assistirmos à reinauguração da barragem, quem sabe…
    Tenho fé que o nosso companheiro Gabriel nos facilite um convite… lol…lol…

    Abraço

    P. Cabrita

    PS
    Lanço um novo desafio ao Afonso. A Fazenda Tentativa era a maior fábrica de açúcar de Angola, se não de Áfica. Era onde estava instalada a sede do nosso Batalhão.
    Tanto quanto vi, um pouco à pressa quando por lá passei em 2003, foi praticamente arrasada. As paredes em forma de esqueletos de Auschewitz devem conter ainda resquícios da enorme quantidade de maquinaria que os cubanos arrecadaram e levaram para casa quando se foram embora (dizem-me…).
    A Tentativa fica a cerca de 2 km antes do Caxito, do lado esquerdo. Tem uma tabuleta que mal se vê com o capim em volta.
    Tendo em conta esse seu espírito aventureiro, resquício por certo herdado da nossa veia de navegadores, sugiro-lhe mais esse Cabo de Boa Esperança para dobrar.
    A Fazenda Tentativa, ao nosso tempo, tinha mais de 300 km de picadas traçadas em esquadria na plantação, de forma a permitir o carregamento da cana até à fábrica.
    Um dado apenas para aguçar a sua curiosidade, se entretanto ela for suficiente para o mover até lá.
    Fico com a ideia que o Afonso já conhece a estrada Luanda-Mabubas de cor…
    Nota: quando vier até Lisboa dê-nos um toque. Se vier no último fim de semana de Maio… pode almoçar com metade da Companhia…

  3. Caro Afonso:

    Palmilhei dezenas de vezes o caminho da Central, descendo depois para junto da corrente do Dange, onde passava um pedaço de tempo a matar o vício da pesca: douradas, cacussos e peixe gato, era mato. As suas fotografias relembraram-me o caminho e, juro-lhe, cheguei mesmo a ver o Gasolina, um negro enorme, que ganhara o nome por ser o responsável pelo abastecimento das viaturas e dos motores a combustível da SONEFE.
    Grato por este bocado
    Gabriel

  4. È com uma enorme saudade que ouço vocês falarem da barragem das mabubas pois morei lá desde que nasci o meu pai trabalhava lá na central era o sr casimiro ,e ouvir falar do gasolina que me lenbro tão bem
    E as noites que iamos a barragem passear depois do jantar ,que boas lembranças
    o meu pai era o chefe lá da barragem e morasvamos nas casas
    logo a cima na saida da barragem

  5. E com muita tristeza e saudades que sinto ao ver as mabubas onde morei muitos anos sou filho mais velho do sr jose campos padeiro das mabubas ate 1975 .Alguem conheceu.Obrigado

  6. Embora instalado na Fazenda da Tentativa com a C.C.S. do Bat. Cav. 2870 ( Nov./70 a Maio/71 ) tive oportunidade de conhecer esse belo recanto das Mabubas.
    Era perto de lá que existia o controle de passagem para outras localidades.
    Tenho fotografias, no aquartelamento, a tocar em cima de um camião Mercedes,em animação, para civis e militares.
    Felicidades.
    Ângelo Costa

  7. Gostei, falaram muito das Mabubas minha terra – nasci e vivo actualmente aqui.
    É com muita satisfação saber que há tanta gente que aqui passou.

    Obrigado.

  8. Caro Afonso, o meu muito obrigado por possibilitar o reviver de locais que ficaram na mente, não só pela beleza dos mesmos, mas também porque significam uma parcela do tempo vividol por terras de Angola. Fico, contudo, triste por ver o abandono em que a barragem se encontra e espero que a sue recuperação possa ser efectivada dentro em breve, para beneficio da economia da saúdosa Angola. Quanto ao filho de um tal Casimiro que ali trabalhou, ghostava de saber, porque já não me recordo, se era um funcionário que era oriundo do alto Alentejo que tinha, penso eu, duas filhas e que me deram a possibilidade de confreternizar com eles a partir do momento em que identifiquei o meu pai, também ele funcionário de uma barragem, mas esta no Rio Tejo de nome Barragem de Belver e onde vivi cerca de 12 anos. Saudações amigas para todos os ex-camaradas da c.caç. 3441 e tb. o meu agradecimento para os que de uma forma meritória me tem proporcionado, embora por vezes de forma nostálgica, reviver momentos que estavam um pouco subtraídos na mente. Um forte abraço Figueiredo ( Pinto)

  9. É sempre bom recordar por onde passámos e vivemos. Morei nas Mabubas 4 anos e andei na escola até ir para Luanda, fiz lá a primária e recordo os meus coleguinhas portugueses e angolanos.Nunca mais voltei a Angola desde 1975 mas desejo que tudo se recomponha. Gostaria de ver fotos da localidade e da escola que frequentei. Recordo a barrqagem e tenho fotos lindas tiradas lá. Um abraço

  10. Nasci e vivi nas Mabubas até 1971. Sou filha do Sr Almeida, a minha casa ficava entre a messe dos oficiais e a dos sargentos / furriéis. Só me resta agradecer a todos que elaboraram esta página, pois fizeram -me recordar a minha infância que foi cheia e muito feliz. Um abraço

  11. Resido em Vizela, em condiçôes previligiadas e muitas das vezes, salta-me á mente as Mabubas,Barra do Dande e Ambriz.
    Conheci esses locais enquanto cumpria o serviço militar e nâo me importava ,nada, de lá viver.
    Infelizmente as condições existentes não o permitem, caso contrário lá estava eu gozar os m/rendimentos.

  12. Sou filha da gabela, não conheço Mabubas,que me recorde, mas
    ao ver a Gabela do antes e a Gabela do agora, e assistindo a Guerra de outroa(1974). Concluí que uma guerra impossível de ser travada pelos africanos, retornados ou refugiados, não tirou de mim as boas recordações e que a Gabela não saiu da minha memória, e ficou com mais gostinho a saudade.
    Agradeço essas fotos e tudo mais, pelo carrinho demostrado. Ao ver as fotos e ler os comentários, notei que o espirito humano dos angolanos não desapareceu, ao fim de tantos anos neste país tão descomhecido de mim. tchau

  13. É com grande alegria que escrevo pois através das poucas palavras que aqui são ditas para falar sobre uma terra que nos troxe tantas recordações,acabo de encontrar o nome de um nome que me lembro muito bem e fui amiga e os pais dela amigos ,a mãe era madrinha da minha irmã Luisa ,mas não sei como contactar com ela,por favor não podem me enviar algo que possa falar com a mesma? aguardo,são tantos anos
    obrigado
    O nome é:Raquel Almeida

  14. Tudo que acabei de ler e ver me emocionou bastante porque muitos dos intervenientes aqui expostos são do meu conhecimento,particularmente a Raquel Almeida e a Lúcia que foram colegas minhas de escola a que a Lúcia se referiu, de recordar que eu sou o josé joão,filho do senhor joão garcia trabalhador da SONEFE,e que na altura moravamos no alto onde se situa a Estação de Tratamento de Água que abastecia as Mabubas. As ex-colegas de escola acho que ainda se recordam da querida professora Ernestina Botelho de Carvalho? E para informação de todos os intervenientes desta página a barragem e central estão a sair dos escombros a que fora submetido, pois a albufeira já se encontra quase ao nível do que era antes e a central já ensaiou a sua 1ª Turbina. A todos desejo votos de muita saúde, e quem sabe um breve encontro.

  15. Agora com a Barragem das Mabubas reabilitada, espero que possamos usufruir da sua energia eléctrica (que muito anseamos) e em melhores condições…

    Obrigado.

  16. Olá Zé João, lúcia, Tita e todos os que aqui escrevem . Sou a São a filha mais velha do Almeida e irmã da Raquel. Ler tudo o que aqui lembramos é um balsamo para a alma, mas também é um contentamento descontente, é um angústia permanente, uma revolta e uma dor. Quem me dera puder voltar. Será que persebi bem e o Rui Alemão ainda lá vive?
    Se sim conta-nos como está tudo.
    Mélita Ferreira se leres esta mensagem diz alguma coisa, como está o Carlitos, o Alberto…o meu mail é capazdealmeida@gmail.com

  17. Olá! Sou nora de Ernestina Botelho a tão querida professora.Saudosa por informações sobre seus queridos alunos , inunda os olhos com lágrimas de saudades cada vez que ,com frequência relata como era feliz na Tentativa e como sente falta de todos os alunos. Seu maior sonho é reencontrá-los. Uma mulher com riqueza em detalhes na memória, lembra de cada aluno com amor.Hoje com 86 anos , ativa , ficaria muito contente se alguém entrasse em contato.Mora na cidade do Porto-PT .
    se quiserem informaçoes meu e-mail é lidanna63@gmail.com
    grata e abços

  18. Olá a todos os que viveram nas Mabubas.
    Como já referi eu vivi lá entre os anos de 1969/1972.
    Quanto à nossa querida professora, D Ernestina,, ainda comunico com ela muitas vezes, através do telefone. Continua com aquela voz dinamica e simpática.Visitei-a há uns anos atrás no Porto e foi um abraço demorado e cheio de emoção.Gostaria de contactar alguns dos seus alunos dessa época, lembro-me dos irmaos Carlos e Toni Silva, Manuel e tantos outros. Agora vivo em Portugal depois de ter vivido também no Brasil, terra onde nasci.Um abraço amigo a todos.

  19. Que surpresa!
    Estive aquartelado nas Mabubas, 1970/71. Compª Cav. 2500 (Bat. Cav. 2870), o n/ comandante era o falecido Cap. Cruz, então também jovem e, ainda mais, a sua bela esposa, que teve um filho nas Mabubas.
    Recordo-me de uma família de cagaréus que viviviam em frente à n/ messe (fui Furriel). No Natal de 70 fizeram questão que eu fosse lá cear; tinham uma jovem filha de idêntica idade à minha (23).
    Por agora, não me recordo de nomes, contudo é uma questão de eu consultar o meu diário de guerra.
    No final da comissão fomos para as Mabubas como espécie de recompensa da missão e baixas no Cuito Cuanavale, Lupire, Longa…
    Também estive destacado no Icau, onde convivia com a jovem professora Trindade, que, simpaticamente, me obsequiou com recordações (tecidos, etc) para eu trazer para, então, minha namorada, hoje, m/ mulher.
    Lembro-me dos jogos de matraquilhos no cafézito, lá em cima, junto à entrada do recinto.
    Tenho interessantes fotos nas Mabubas.
    Talvez volte aqui.
    Entretanto, saúde, saúde, saúde!

  20. Volto a recordar.

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