Teoria da conspiração
Afonso Loureiro
Poucas horas entradas na madrugada do dia 21 de Maio de 2010, um King Air proveniente de Pointe Noire pediu autorização ao controlo de Luanda para iniciar a descida e aterrar. Estava a cerca de 70 milhas do aeroporto 4 de Fevereiro. O avião, os dois tripulantes e um passageiro desapareceram sem deixar rasto após este último contacto.
A rota entre Pointe Noire e Luanda é paralela à costa, sempre sobre o mar e, assim que o dia nasceu, iniciaram-se as buscas na última posição estimada, procurando destroços na água ou na faixa costeira, já na província do Bengo. A falta de radar não permitiu conhecer a trajectória real do aparelho, mas a protecção civil, Polícia e Força Aérea patrulharam toda aquela área de helicóptero, sem nada descobrir. O avião tinha-se eclipsado.
O bom tempo que se fazia sentir, como é habitual para a região e época, não seria motivo para que um B200 se despenhasse sem justificação. O avião tinha voado de Luanda para Pointe Noire e regressou de imediato, pelo que se adiantou uma eventual falta de combustível, caso não tivesse havido reabastecimento no Congo. Uma situação destas daria tempo ao piloto de declarar uma emergência e alertar o controlo para a aterragem ou amaragem forçada eminente. O estranho silêncio rádio que se seguiu ao pedido de autorização para aterrar descartou a hipótese. Tudo apontava para uma avaria súbita e catastrófica que tenha deixado o avião e a tripulação fora de serviço.
Caso o avião tivesse caído inteiro no mar, seria suficientemente grande para que, pelo menos, ficasse um pedaço da fuselagem à tona. A aparente ausência de destroços e o corte de comunicações indicavam uma explosão em pleno voo.
King Air
Uma semana depois, sem quaisquer vestígios encontrados, com as buscas suspensas e o caso entregue às instâncias superiores, os mujimbos começaram a circular.
As ligações de Rashid, o passageiro mauritano, a altas figuras angolanas e os muitos negócios de milhões em que estava envolvido fizeram despertar dezenas de teorias para explicar o caso. O desaparecimento, puro e simples, do bimotor não podia ser a história toda. Uma bomba-relógio, por exemplo, dava um argumento muito mais emocionante, prometendo vingança servida fria, negócios pouco claros e traições, mesmo ao gosto de quem já não se surpreende com muito.
No que toca a esquemas, a imaginação angolana vai muito para lá das explicações simplistas de bombas em aviões. Começou-se logo a pensar se o avião não tinha sido convenientemente desviado num dos poucos sítios onde não há maneira de confirmar a sua verdadeira posição, desaparecendo misteriosamente. Sem radar, o controlo aéreo apenas pode confiar nas posições reportadas pelos pilotos, mas nada pode fazer se estes as falsearem.
Voando de noite, e sabendo que eventuais operações de busca só começaram após a alvorada, quem desvia o avião tem algumas horas de avanço, podendo chegar a uma pista alternativa e esconder a aeronave sem grandes preocupações. A grande questão era saber qual a pista escolhida, uma vez que poucas são as pistas secundárias com iluminação nocturna na região.
Como até mesmo as pistas secundárias têm alguma forma de controlo e alguém teria visto ou ouvido alguma coisa, esta teoria foi alterada para outra ainda mais rebuscada. Por sinal, o avião em causa é capaz de aterrar sem grandes problemas em terra batida, podendo uma estrada iluminada por alguns carros servir de pista improvisada. Os possíveis destinos cresciam exponencialmente.
E depois, lembrando-se das ligações do homem de negócios desaparecido, alguém sugeriu que o sítio ideal para fazer aterrar o avião-fantasma seria o novo aeroporto de Luanda, uma zona militar vedada e longe de tudo. As pistas inacabadas serviriam perfeitamente e o avião ficaria escondido à vista. Rashid desaparecia com os seus segredos e todos ficavam contentes.
A melhor conspiração é a que não se consegue provar e esta começa a reunir todas as condições para se tornar numa de alta categoria.
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