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Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

22  06 2009

Pérola do Musseque

Luanda, a cidade dos contrastes, tem uma relação muito estranha com o seu património. Não sei se é a Luanda cidade ou a Luanda gente que o causa, mas desconfio que ambas tenham influência.

Em Luanda, todos os edifícios que se atravessam no caminho do progresso têm o destino traçado com uma máquina de rastos. Não interessa se são importantes ou não para a História. Se ocupam terreno valioso, vêm abaixo.

pérola_3
Falta pouco

No meio de tanto edifício derrubado, há dias em que perdemos a esperança de que a cidade seja capaz de conservar a sua Memória ou a sua identidade. Só que, às vezes, somos surpreendidos com fabulosos pedaços de Memória nos sítios mais inusitados, que resistem inexplicavelmente.

Não é por haver quem as defenda, porque esse é o primeiro passo para que alguém repare no local e comece a pensar no que poderia ali construir. Mais tarde ou mais cedo será escolhido para albergar as fundações de uma nova torre reluzente. As coisas resistem devido a um completo desinteresse. Mesmo que sejam monumentos importantes, são indiferentes. Não há interesse em preservar ou destruir e vão ficando, como os letreiros dos negócios do tempo do colono.

No musseque do Prenda, pelo meio das casas com telhados de chapa e paredes tortas, encontra-se uma destas surpresas. Consegue-se ver do viaduto na estrada da Samba, quase à sombra do Mausoléu inacabado. Ficou mais visível desde que demoliram uma casa. Passei a chamar-lhe A Pérola do Musseque.

Maianga do Prenda
A Pérola do Musseque

Um chafariz de meados do séc. XIX é sempre algo que chama a nossa atenção, mas quando o encontramos no meio de um bairro como o Prenda e pintado de novo, é caso para acreditar em milagres.

Pérola_2
Maianga reedificada em 1849

A parte melhor desta história é que aprendi o significado da palavra Maianga e voltei a ter esperança no futuro do Passado da cidade.

Agora só tenho de arranjar coragem para ir lá fotografar o chafariz de perto, em vez de ficar na jaula com rodas a usar a tele-objectiva.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

3 respostas a “Pérola do Musseque”

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  1. Obrigado por revelar essas pérolas!

    Um chafariz do século XIX que foi renovado no meio do Prenda??! Tou perplexa! 🙂

    Afinal ainda há esperança para a não destruição massiva das reliquias…

  2. Infelizmente a confusão entre desenvolvimento e vandalismo cultural não é exclusivo angolano. Certamente as rupturas culturais abruptas não ajudam. As feridas de guerra muito menos. E as transformações sociais…e a sobrevivência… e tanto mais… É uma dor que acompanha o amor que ficou de vivências inesqueciveis. Porventura afloradas nessa espécie de arqueologia social. Que belas revelações!
    Um abraço

  3. Fica na Samba?
    Quero ver também!

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