Embondeiros
Afonso Loureiro
Portugal é um país pequeno, mas não tem paisagens monótonas porque é muito variado. Perto das montanhas há planícies, junto de vales encantadores e do mar. O horizonte raramente pode ser descrito como uma linha suave. Há sempre um relevo que nos recorda que é tudo já ali.
As distâncias em África têm uma escala à qual não estamos habituados. Uma planície é algo de inimaginável, que se estende a toda a volta até ao horizonte e ainda mais para lá. A erva seca e as árvores despidas transmitem uma sensação de que a vida não foi capaz de encher tanto espaço de uma vez só e faz-nos sentir pequeninos…
A imensidão das paisagens angolanas, das suas planícies a perder de vista, é compensada pela majestosidade das árvores que a salpicam. O embondeiro é o verdadeiro símbolo de Angola. A sua silhueta em forma de garrafa com uma copa quase despida destaca-se da paisagem e são verdadeiros marcos. Começam por ser umas árvores esguias e vão engordando com o passar dos séculos. Os ramos finos e quase sem folhas parecem uma cabeleira. No final do Verão têm as múcuas penduradas, o fruto do embondeiro. Parecem brincos.
Inverno
Apesar de não serem árvores muito altas, alguns atingem proporções colossais, do tamanho de casas. Infelizmente, tal como em Portugal, em Luanda as árvores são abatidas apenas por duas razões. Por tudo e por nada. Nem os embondeiros escapam. Mesmo as árvores centenárias são vandalizadas, queimadas e abatidas a machado, moto-serra ou explosivos. Como são muito grandes, há muitos embondeiros em que o trabalho foi deixado a meio. Acabam por morrer mutilados alguns anos depois. Uma vez abatidos, são demasiado grandes para serem aproveitados para madeira ou lenha e ficam onde caíram, a apodrecer. Passam a ocupar mais espaço deitados do que alguma vez ocupariam de pé.
Na maior parte dos locais, a sua imponência vai-se perdendo à medida que ficam rodeados de casas e de lixo. Apenas nos sítios onde não se pode mesmo construir é que não se abatem embondeiros. Estes sítios resumem-se aos leitos de cheia dos rios. Nestas várzeas surgem uns bosques que disfarçam o lixo e a miséria, como me apercebi nas primeiras visitas aos musseques. A sua disposição à volta da água, o seu tamanho e a cor acinzentada fazem lembrar uma manada de elefantes à beira-rio.
A Manada à beira-rio
E agora espera-se que apodreça
Resistente
Mais valia pintar uma casa
Garrafão de tinto
Imponente
Embondeiro a prazo
Elefantes na savana
A luta pela sobrevivência embrutece as pessoas. Quem trabalha de Sol a Sol não consegue apreciar a beleza do pôr-do-Sol na baía de Luanda, porque esse é apenas o instante que marca o fim da jorna e antecipa um magro jantar. Quando se passa fome é impossível olhar para uma árvore e ver mais do que uma árvore – uma fonte de lenha, comida ou de materiais de construção. Um embondeiro é muito mais do que isso, é uma entidade com uma presença própria, que se sente quando se lhe toca na casca rugosa do tronco, que se intui ao ver a sua sombra engolir a nossa. Cada copa revela uma personalidade diferente. Descobri embondeiros coléricos a discutir com outros bem mais pacientes. Vi embondeiros deslumbrados com o mundo, vivendo num perpétuo espanto. Outros tinham um ar sonhador e infantil. Muitos estavam apenas cansados. Não sei se cansados de viver, ou da vida que vêem.
É curioso a maneira como aprecias cada pormenor daquilo que te rodeia. Ontem foram as mulheres, hoje os embondeiros amanhã…. ficamos á espera.
voce escreve sem saber. porque não te vais emboa de angola
Hei-de regressar a Portugal, fique descansada.
Não és o Carolus Linnaeus, o Príncipe dos Botânicos, mas tens muitos conhecimentos sobre a Botânica, conforme demonstras nesta árvore que também é o verdadeiro Símbolo de Angola.
Parabéns Professor e continua a escrever
JR
Olá. Estou fazendo uma pesquisa sobre estas lindas árvores.Fiquei encantada com a forma poética com que te referes a estes “elefantes” africanos. Para mim elas deveriam ser o símbolo natalino e não o pinheiro.
Lembro-me de ter visto alguns embondeiros a servir de decoração de Natal. Mas eram poucos quando comparados com os pinheiros.
Sou um humilde angolano distante, mas enaltece-me o facto de haver pessoas que procuram valorisar a alma de Angola.
Bom dia…ontem ao fazer um passeio entre Luanda e Catete deparei-me com essas árvores gigantescas que faziam um cenário deslumbrante nos grandes pedaços de terrenos que circundam as estradas,lindas de verdade fiquei encantada com tal cenário,os embondeiros são árvores que depois das suas folhas cairem são ainda muito mais bonitas,consideradas património nacional em Angola!
E, curiosamente, o embondeiro que está de vigília ao Aerograma (lá no cimo da página), foi fotografado nessa mesma estrada.
Pois,eu reconheci o local e por isso mandei a mensagem,lindo não é??adorei ver essas arvores despidas,é um cenário lindo!
boas..estou a pensar levar um embondeiro para portugal e mante-lo em estufa durante a epoca do frio sera que ele se aguenta? há algum registo de imbondeiros em portugal?
Há embondeiros no Parque das Nações, mas suponho que preciso de um atestado fito-sanitário para importar espécies vegetais não endémicas.
EMBONDEIROS !!… sou apaixonada por eles…
Nasci em Luanda e tive o privilégio de haver 4 embondeiros ao pé da minha casa. Costumava brincar na base dum deles e inclusive tenho uma foto dum gato que tinhamos, ao lado dessa árvore.
Admiro a capacidade Afonso Loureiro tem em conseguir ver as várias “caras” que eles têm…