Mais dezanove anos de espera
Afonso Loureiro
Por alguma razão, há dias que nos ficam marcados na memória de forma mais persistente que outros, às vezes com recordações que ficam adormecidas décadas.
Durante dois anos, a Lua, especialmente nos dias em que enchia o céu com um sorriso bonito ou uma cara bolachuda, foi o ponto de encontro de olhares a meio mundo de distância e permitiu recordar rumbas dançadas ao relento em noites de Verão. Agora, nos primeiros dias da estação quente, com a noite a chegar tarde, a sua mancha branca preenche um céu vazio de nuvens e desperta recordações velhas de vinte anos.
Na altura em que os terrenos do jardim em volta do Palácio ainda eram utilizados para ensaio de sementes e a estrada não tinha engolido a Ribeira das Forcadas, lembro-me que decidi ver nascer o Sol numa manhã dos últimos dias de Junho. Dois dias seguidos acordei cedinho, subi o monte e esperei. Teria sido um momento sem muito mais significado que assistir ao dealbar do novo dia se, ao segundo dia, não tivesse olhado para o outro lado, em busca das sombras que desapareciam, e lá estava ela, a Lua Cheia enquadrada por duas oliveiras centenárias.
Lembro-me que achei interessante repetir a experiência, mas depressa me desiludi, porque para ter o Sol e a Lua nas mesmas posições relativas e assistir a tudo do mesmo sítio implicaria esperar que os calendários solar e lunar voltassem a bater certo, coisa que só a cada dezanove anos acontece. Ver a Lua Cheia desaparecer entre aquelas duas oliveiras na alvorada teria de esperar.
Lua de Luanda
Tudo isto ficou esquecido até agora, que reparei na Lua, que incha continuamente à medida que o fim do mês se aproxima. Talvez a experiência se repita agora porque dezanove anos é muito tempo para esperar por alguns minutos de contemplação.
Na noite marcada, com os horários bem estudados, acordei duas horas mais cedo, excitado. Pela janela fui espreitando a posição da Lua e o horizonte Oriental a mudar de cor. Tudo parecia perfeito. A cerca de meia-hora de sair de casa, algumas nuvens começaram a ocultar a Lua, em sinal de mau agoiro. O céu límpido da madrugada, a prometer espectáculo igual ao anterior foi ficando farrusco e acabou por esconder o momento ansiado. Que desilusão.
A paciência é uma virtude e daqui a dezanove anos tudo se repete.
Vou-te oferecer uma cadeira no próximo aniversário…