Cidade-fantasma
Afonso Loureiro
Lá fora, as bandeiras verde-rubras esvoaçam silenciosamente nas janelas e as ruas estão desertas. Hoje faz mais barulho o vento nas árvores que o trânsito da via rápida. Na feira do livro, os alfarrabistas fazem pilhas de livros velhos para equilibrar pequenos televisores de som roufenho e imagem desfocada. Os das bancas vizinhas abandonam a mercadoria e juntam-se em volta do ecrã, para assistir à partida e imaginar os lances que a chuva do televisor esconde.
A barraca das farturas está fechada, tal como a do pão com chouriço. A da cerveja parece um cinema, com as cadeiras dispostas à volta do televisor e toda a gente com uma garrafa na mão. «Maldito Casillas!» resmunga alguém.
Durante dez minutos, as ruas enchem-se de carros que circulam acelerados. O intervalo é curto e é preciso aproveitá-lo bem para se chegar antes que o jogo recomece. Os patos, sem ninguém que os suborne com pão seco, não estão ao pé da ponte e alguns pastam no relvado do jardim onde as crianças costumam correr.
É impressionante como a partida de futebol conseguiu tornar uma cidade com uma centena de milhar de habitantes numa pacata vilória do interior. Tirando a ocasional corneta barulhenta, claro!
O resultado logo se verá.
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