Quem esquece a História está condenado a repeti-la
Afonso Loureiro
Muito se tem falado acerca da recente crise económica e do que as limitações impostas pelas políticas monetárias acarretam em termos de redução da soberania dos países europeus.
Neste momento há um banco central que emite moeda, como existiam vários bancos centrais a emitir as moedas que se extinguiram com a entrada em circulação do euro. Ao contrário dos bancos anteriores, este não faz empréstimos aos estados, apenas aos banco privados. Os estados, se quiserem financiamento ou emitir dívida flutuante (que antigamente faziam imprimindo mais dinheiro e, por consequência, desvalorizando a moeda), socorrem-se dos bancos privados – os que encaram estes empréstimos como negócios cada vez mais lucrativos.
Os estados são obrigados a financiar-se a juros dignos de agiotagem, graças à linha neoliberal que tem seguido a Europa nas últimas décadas. Os principais benificiários desta política são os bancos alemães que, a coberto da lei do mercado, emprestam à Grécia a 10%, à Irlanda a 9% e a Portugal a 7% – por enquanto. Mas os "mercados" têm as costas largas, porque este esquema não tem nada de original e esta conquista económica da Europa por parte da Alemanha não é novidade.
Moeda única
Há cerca de oitenta anos, com meio continente invadido pelas tropas do Terceiro Reich Alemão, uma das medidas lançadas pelo governo alemão foi a criação de uma espécie de moeda única para pagamentos nos países dominados, os vales da Caixa de Crédito do Reich (RKK – Reich Kredit Kasse).
Estes vales eram moeda legal e tinham de ser aceites em qualquer transacção. Ao invés de um confisco, criava-se a ilusão de um pagamento legítimo. Os bancos centrais dos países eram, por sua vez, obrigados a redimir estes vales e fazer o pagamento do seu valor facial directamente aos cofres do estado alemão, em moeda forte ou ouro. Na Alemanha imprimiam-se mais. A teoria económica vigente era a de que, se a crise chegasse, os seus efeitos deveriam ser sentidos fora da Alemanha, nos países ocupados.
Actualmente, parece que o Banco Central Europeu se limita a emitir moeda que os bancos centrais dos vários países têm de usar para pagar empréstimos aos bancos alemães, por outras palavras, a Alemanha voltou a emitir vales RKK e os outros pagam como podem. O domínio alemão da Europa chegou sem exércitos.
A questão é: será isso mau?
Os alemães acham que não. Os outros… depende.
Reformulo a minha pergunta: será isso pior do que a situação actual?
A situação actual também se explica pelo que tem acontecido para que isso se torne realidade.
Caminhamos para uma Europa Federal mas, por enquanto, ainda só há os deveres do federalismo. Talvez cheguem os direitos.
Numa Europa verdadeiramente unida, os Estados (cada vez mais apagados) não negociavam empréstimos de dívida pública, seria o supra-estado, a União Europeia a fazê-lo – de forma mais vantajosa, obviamente.
A situação actual é um limbo em que ainda não desapareceram os Estados, mas em que a Federação se começa a impôr. É claro que poucos aceitariam de bom grado uma transição súbita, especialmente os milhares de boys com tacho garantido nos vários países, mas, aos poucos, o sonho alemão vai-se realizar.
Se estiveres recordado da anedota acerca do Euroenglish, lembra-te da conclusão:
«Finaly, ze drim vil kum tru!»
Lembro-me dessa anedota quase todos os dias, sempre que falo com colegas alemães 🙂