Fui ao Baeta!
Afonso Loureiro
Ao fim de alguns meses em Angola, dei por mim a olhar para o espelho e a ver uma coisa parecida com um Beatle. Um cometa, portanto.
Raros eram os dias em que acordassem sem ter o cabelo a imitar um desastre aéreo. Não havia pente ou água que ajudasse. E o remoinho no alto da cabeça tinha vida própria.
Só havia uma solução: cortar o cabelo. Mas onde?
Perguntei ao nosso guia, o tal Português que mata leões à bofetada, quanto custaria um corte de cabelo. Depende… nos barbeiros de rua, cerca de 1000 kz. No Hotel Trópico, onde têm umas meninas bonitas a cortar cabelo, 50 dólares.
Uma barbearia chamada Desejo
O mais barato é mais caro que em Portugal… estamos bonitos.
Quis o destino que me cruzasse com o zungueiro das 11h15, que vai da Mutamba à Maianga. Nesse dia, tal como nos outros, vendia máquinas de cortar cabelo.
«Quanto é?»
«1800»
«É caro…»
«Lá na loja custa 3000…»
«1200. Que dizes?»
«É pouco.»
«É p’ra negociar, yá?»
«Hmmm… 1500»
«Pode ser»
Será que os 300 Kz de desconto me faziam mossa no orçamento? Provavelmente não, mas regatear faz parte do negócio. Pelo que tenho visto, os preços propostos são cerca do dobro do custo. Da metade para cima é a margem do vendedor. Assim por alto, teve um lucro de 600 Kz.
Depois de carregada a máquina, deitei mãos à obra. A meio do trabalho tive uma certa pena da máquina, dó mesmo. Acho que nunca previram ter de vir a cortar arame…
Depois de muito esforço
Como o cabelo venceu várias vezes a carga da bateria, ainda andei a passear pela casa com um aspecto um pouco estranho. Meia cabeça cabeluda e a outra meia com o cabelo curto. Fui motivo de galhofa, claro.
Mas agora já pareço eu outra vez. E deixei de ter vontade de cantar Yé-yé-yé agarrado à escova de dentes, sempre que me vejo ao espelho
Penteaste-te, portanto.
Ainda pensei que ia ver-te de caracóis a cantar que tinhas dois amores!
Podias ter aproveitado para ir à glamourosa barbearia Desejo.
Ficarias a saber mais… O nome quer dizer que as pessoas, ficando bem servidas, têm o desejo de voltar ou, pelo contrário, manifestam, depois das galhofas reprovadoras, o desejo de nunca mais. Nada como experimentar par melhor ajuizar.
Agora que já tens alguma experiência, podes montar uma barbearia à qual podes dar o nome de “mestre da obra que sair”.Ah!Ah Ah!
Parece q já estou a ver o meu marido a passar pela mesma situação…
faz bem levar as coisas na brincadeira. Não devem faltar situações hilariantes às quais deveria escrever um livro “crónicas da minha passagem por Angola”. (risos)