Fim da garantia
Afonso Loureiro
Quando era pequenino, pouco depois de sair da primária, tentei partir um muro à dentada. Inocentemente, julguei que tinha hipóteses, mas descobri, logo no primeiro assalto, que estava enganado. O muro ganhou por larga vantagem, neste caso, por um pedaço de incisivo.
Graças aos dotes de escultor do dentista, pouco tempo depois podia sorrir com o dente completo. Tinha era a garantia de que o compósito só duraria dois ou três anos.
Na verdade, durou esses anos todos e mais alguns. Com o passar do tempo, começou a notar-se uma diferença de cor entre o dente e a reparação, mas continuou firme e hirta, cumprindo a sua função estoicamente.
Ao fim de duas décadas, um pedacinho desistiu. Curiosamente, foi da parte de trás. À frente continua impecável. Quem me dera que todas as garantias fossem como esta…
Na próxima viagem a casa já sei que tenho de ter uma daquelas conversas interessantes em que vou dizendo «Hmm, hmm… Gaa-gol… Hã.» enquanto me sugam saliva pelo canto da boca.
Em obras
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