Luanda de respiração suspensa
Afonso Loureiro
Numa tarde abafada de Cacimbo, as ruas estão desertas. O polícia que guarda o edifício do Governo Provincial dormita na cadeira, imitando os seguranças das lojas da Mutamba, lá em baixo. Parece que é proibido passar debaixo da varanda do edifício, mas hoje ninguém anda na rua.
No jardim, a estátua da mascote do campeonato africano de basquetebol de há uma década vai-se inclinando lentamente para a direita. O jogador Vitó, com uma máscara tradicional na cara, continua a segurar a bola sobre a cabeça, como que prestes a encestar. A sua imobilidade condiz com a calma da cidade. Parece uma qualquer cidade do interior, onde nada acontece.
Na Igreja do Carmo está sempre fresco. Alguns jovens conversam baixinho nos últimos bancos. Os azulejos azuis e brancos e a talha do altar bem cuidada remetem-nos para uma época que não a nossa, em que havia tempo para tudo. O tecto pintado com cores fortes contrasta com a alvura do hábito da irmã que prepara o altar para a eucaristia.
Numa salva traz o cálice, que pousa junto das imagens de São Paulo e da Nossa Senhora da Assunção, os padroeiros de Luanda. Regressa com uma chave na mão, que, com a cabeça baixa, introduz na fechadura do relicário e desaparece pela porta da sacristia. Pouco depois ouve-se o zumbido do sistema de som encher a igreja silenciosa.
Alguns fiéis começam a chegar à missa da tarde. Hoje promete ser pouco concorrida.
No regresso a casa, surpreendo um dos seguranças do banco a fazer palavras cruzadas, «para passar o tempo, que hoje está muito calmo, chefe». Conversamos um pouco sobre coisa nenhuma. Está realmente calmo. Parece que a cidade susteve a respiração.
Horas depois, estoura a festa. Gritos, buzinas, tachos batidos, corridas na rua e vozes roucas anunciam a vitória.
«Éu-ê! A Taça é Nossa! Éu-ê! A Taça é Nossa!»
A final do campeonato africano de basquetebol foi vencida por Angola. O resultado não interessa. Angola ganhou. Agora percebo porque estava tudo tão calmo. Era da expectativa!
Caro Afonso,
O basquetebol angolano tem uma boa história. Antiga. Merece a Taça. Mas o que me chamou a atenção hoje foi a referência do Afonso ao fresco que sempre faz na Igreja do Carmo. Há muito que não pensava nesse fresco bom. E foi ele que me valeu quando eu e a minha namorada casamos nessa bonita igreja em 3 de outubro de 1964. Não fosse a frescura do ar climatizado pelas grossas paredes e eu ter-me-ia encharcado em suores nesse memorável dia. Alegro-me por saber que o fresco continua lá, assim como São Paulo e a Nossa Senhora da Assunção e, penso, a Nossa Senhora do Carmo.
Na verdade é a Igreja do Carmo que dá o nome à Freguesia. E a propósito de Freguesia do Carmo recordo-me de um leitor do Aerograma, José de Sousa, nascido nesta freguesia, na Casa de Saúde Fidelidade e que fazia questão em saber se a dita Casa de Saúde ainda existe. Eu sei onde era a Casa de Saúde Fidelidade, mas não sei se ainda existe. Situava-se numa rua prependicular à rua Luciano Cordeiro. A rua L.Cordeiro ligava a rua Serpa Pinto à rua do Restauração (actual avenida do I Congresso?). É decifrável? Quando se vem da Maianga pela antiga Serpa Pinto a Luciano Codeiro ficava à esquerda imediatamente antes do Largo S.Pinto. A Casa de Saúde Fidelidade era na segunda rua à esquerda antes de chegar à Av.I Congresso. Confuso? Ainda lá chegaria de olhos fechados, como se diz. Ao lado dessa clínica existia uma bonita esplanada onde era agradável estudar e namorar.
Desculpe esta deriva Afonso.
Um abraço.
Julgo que já sei qual é a rua. Vou lá dar um salto para ver o que resta desses tempos.
Caro Elmiro Ferreira,
Muito bom dia.
Muito obrigado pela sua informação.
Embora tenha saído de Luanda em Junho de 1975, com a idade
de 3 meses, foi uma alegria enorme saber um pouco mais
do meu passado. Só tenho pena de não ter tido oportunidade
de viver os tempos gloriosos de Angola.
A minha mãe viveu lá muitos anos, e jamais esqueceu aquela
terra, e continua a considerá-la a terra do seu coração.
Quem sabe se não se cruzou com os meus país em Luanda,
nessa altura ?
Aceite um abraço tropical de
José de Sousa
conheci o meu marido na casa de saúde da fidelidade em Luanda em 1964, o meu marido foi morto em 75, pela F.N.L.A em Nova Lisboa, e eu gostava muito de mostrar aos meus netos o lugar onde tinha conhecido o avo, por isso agradeço muito a quem tiver uma foto se me pode enviar para fatimavideira@meo.pt
a prepositivo também eu andei a buzinar nas ruas de Nova Lisboa para festejar esse dia, pois tinha um cunhado, hoje medico em Luanda Dr Rui videira que jogou nessa altura, a polícia ainda me mandou parar e dizer que não podia buzinar, mas eu respondi que quando ganhava o Benfica eles não diziam nada, e lá continuei
um abraço
Fátima