A derrota
Afonso Loureiro
Desde que os estádios começaram a ser construídos que se aclama a selecção angolana como campeã. É uma questão de justiça. Se Angola é a maior em tudo, também será, certamente, a maior no futebol. Jogar em casa reforçava a intuição popular. Até os jogadores se recusavam a jogar antes de se decidir qual seria o prémio no caso de serem campeões.
Antes de começar o campeonato, perguntámos a um colega qual era a sua previsão para a prestação dos Palancas Negras. «Vai ser uma vergonha se Angola não ganhar!»
A passagem à segunda fase da competição, mesmo que com um jogo que todos acusam de ter sido combinado, apenas parecia confirmar o desígnio nacional de vencedores em todas as frentes. As bandeiras eram agitadas com mais fervor, as cornetas sopradas com gana e os jingles radiofónicos dos patrocinadores cantados como se fossem o hino.
Depois veio o silêncio. Todo o país parou para ver o último jogo, mas não se ouviram gritos a comemorar golos, nem cornetas a confirmar uma boa jogada, apenas um silêncio sepulcral.
Nem tudo eram favas contadas. A equipa angolana foi eliminada no campeonato por si organizado. Para quem está de fora e conhece mais ou menos as capacidades de cada equipa participante, não foi surpresa nenhuma, nem mesmo para os que nem ligam ao futebol. Para os angolanos, foi um rude golpe no orgulho.
Até então, o brutal investimento nos estádios que paralisou a reconstrução do país era justificado. Enchia de orgulho todos os angolanos que decoravam os carros com bandeiras e, acima de tudo, fazia esquecer tudo o resto.
Na manhã que se seguiu ao fatídico jogo, o sentimento nacional resumia-se ao desabafo do segurança.
«Filhos da Puta! Tanto dinheiro gasto para nada…»
Caro Afonso,
Não sou propriamente um adepto do futebol. Talvez um observador desinteressado. E intriga-me bastante como uma herança colonial pode mobilizar tantos angolanos e deixá-los de cabeça perdida. Bem, perdida é um modo de dizer. Deixá-los assim do pé para a mão com 4 (quatro) grandiosos estádios de futebol nos braços para amamentar. Já tinham o exemplo dos portugueses que não cuidaram de poupar para os tempos difíceis. Bem podiam ter optado por construir escolas. Enfim, é uma pena.
Um abraço.
Só se pode concluir que seguiram religiosamente os passos do colonizador.
Também mais não seria possível pedir!
Errado Calcinhas, o colonizador foi à final e encheu todos os estádios em cada jogo. O desaire financeiro, esse sim, foi seguido à risca.
Caro André.
Quer os angolanos gostem ou não o colonizador esteve, está e certamente estará por muitos anos, muitos pontos acima.
Mas no essencial, e salvaguardando estes efeitos de escala, tudo correu da mesma forma.
Na ex-Metrópole ainda há formação profissional que funciona, até mesmo no futebol, e daí o 2º lugar no Europeu e o 4ª no Mundial.
Mas os tiques são os mesmos!
Calcinhas,
Não creio que o colonizador esteja sempre uns pontos acima. Veja-se o Basquetebol. Angola é uma potência mundial e Portugal uma verdadeira nulidade. Tratam-se de preferências, nada mais.
Calcinhas,
o culpar o colonizador por tudo e por nada não me parece em nada um argumento válido. Quem tem vontade própria, e brio, como foi dito noutro aerograma, muda por si mesmo.
Não há aqui nenhuma intenção de culpar o colonizador, mas apenas uma ironia ao constatar que o colonizado sempre copia o que de pior o colonizador tem. Isto é da natureza humana, não depende nem do colonizador nem do colonizado. E a ironia dirige-se aos ex-colonizados porque da facto continuam durante anos a culpar os colonizadores pelos seus males. Basta ver os comentários dos brasileiros à colonização portuguesa embora sejam independenes à quase 200 anos. Com Angola passa-se o mesmo. É que atirar as culpas para cima dos outros é sempre mais fácil.
Mas objectivamntne fica como resultado de um processo de colonização, que não vale agora a pena ser esclapelizado – passou à história, uma série de padrões de comportamente que tiveram a ver com a influência cultural do colonizador, neste caso português. A lamúria é um problema português como também o é angolano, e isto tem a ver com esse passado. Não é bom nem é mau, é como é. É a vida, e se formos espertos, olhamos para as nossas maneiras de ser e tentamos tirar partido delas.
Os meus comentários iniciais também tiveram a ver com o facto que após mais de 3 décadas de independência constatar que Angola recuou 100 anos. à custa da culpabilização do poder colonial e também tiveram a ver com a incapacidade da classe dirigente de Angola não ser capaz de ver o óbvio, o caminho do desenvolvimento do país passa pela formaçao da pessoas. O meu medo é que Angola não deixe de ser o que Portugal é também, países que “só vão em futebóis”.