Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

05 2010

Eufemismos

Vivendo em Luanda, pouco remédio temos para além de nos acostumarmos aos cortes de energia diários. Durante algumas horas todos os dias, a electricidade é desligada num bairro e desviada para outro, que antes estava às escuras. Quem tem gerador, garante que o gasóleo não se esgote, porque terá de o usar regularmente.

Armário eléctrico
Electricidade

Para além dos cortes programados, há os outros, aqueles que vêm fora do horário, mas chegam tão disfarçados que quase acreditamos que tenha sido para atalhar caminho ou esquecimento de olhar o relógio. Estes últimos, são quase sempre ocasionados pelas sobrecargas que se geram imediatamente após o restabelecimento da energia, por causa de todos os frigoríficos e máquinas de ar condicionado que arrancam em simultâneo, tentando recuperar o atraso que levam em relação ao calor tropical de que a cidade é farta.

A necessidade de abastecer os bairros alternadamente prende-se com a falta de capacidade dos grupos geradores na cidade e linhas de alta tensão das barragens do interior. Não há potência suficiente para abastecer a capital inteira, mas, segundo a posição oficial, os cortes são justificados, não pela falta de energia, mas porque o fornecimento ‘’continua em estado de procura reprimida’’, que é um eufemismo muito mais bonito.

Lá diz o provérbio, ‘’É o pão a acabar e as pessoas a deixar de comer’’.

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

4 respostas a “Eufemismos”

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  1. ‘Estado de procura reprimida’

    Lindo, lindo!!! lol

    Já agora, o que querará dizer ‘procura reprimida?’?

  2. Quando me preparava para responder, reprimiram-me a procura de electricidade e… fiquei às escuras.

  3. Excelente escrita nos posts…brilhante nas respostas aos comentários! ah ah ah!

    Abraço e continuação de bons posts!

  4. Quatro paredes de adobe, um telhado de capim bem aparado, uma porta com 1,5m de altura, um revestimento interior com esteiras, um candeeiro petromax, um fio de nylon com um anzol, e uma 22 longo, o Cuanza ou o Lucala aos pés e uma sanzala de quibalas ou malanginos por perto e um comerciante colonial.

    Sem frigorífico nem conta no banco nem jornal. Apenas um transistor com pilhas para ouvir o relato do benfica.

    Até chego a pensar que certas vivências foram interrompidas só por inveja.

    Até causa vertigens, pensar naquilo que foi!

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