Peregrinação à Muxima
Afonso Loureiro
Em jeito de despedida do Kwanza, aproveitei o último fim-de-semana em Angola para regressar ao santuário da Nossa Senhora da Muxima.
Ao longo de 118 km de estrada de terra batida, apenas nos cruzámos com outros dois veículos, que se avistavam à distância pelo pó que levantavam. A grande surpresa surgiu logo após o cruzamento com a estrada da Cabala, com um engarrafamento digno da capital nos últimos quatro quilómetros de caminho. Sem sabermos, a nossa visita coincidiu com uma peregrinação de dois dias que levou ao santuário milhares de pessoas.
A perder de vista
A estrada da Cabala à Muxima está em obras e, em muitos troços, interditada, pelo que se circula quase sempre numa pista paralela provisória, com muitos buracos e mais estreita. Por causa de um autocarro que avariou num estrangulamento da picada, ninguém podia passar. Ao longo do caminho que subia e descia os montes só se viam autocarros e candongueiros parados, como uma grande serpente metálica. Os peregrinos abrigavam-se do Sol à sombra dos carros, sentados no pó fino, ou em pequenas clareiras no capim das bermas.
Encravados
Com muitas opiniões sobre como seria a melhor maneira de retirar o autocarro avariado, a solução tardou, mas acabou por se conseguir abrir uma passagem e pudemos seguir viagem.
A meio da tarde, o adro já estava vazio e apenas os últimos devotos marcavam presença na igreja, como atestava o reduzido número de sapatos que ocupava os degraus da escadaria. Antes de cada missa, a igreja é varrida e lavada e os fiéis entram descalços, como numa mesquita.
O pó do caminho fica lá fora
A nave está silenciosa. Duas dúzias de mulheres reza baixinho nos bancos, segurando velas apagadas e fotografias de familiares muito amarrotadas. Outras ficam de pé, em frente ao altar, de braços abertos rezando à Senhora da Muxima, capaz das maiores graças. No chão, junto do altar, está o pagamento de uma promessa, duas grades de gasosa e um garrafão de vinho tinto.
Pedidos à Mamã Muxima
Um grupo mais pequeno é o das mulheres que andam de joelhos enquanto rezam. Ajoelham-se à entrada e pedem protecção para as pessoas de quem seguram as fotografias. Quando chegam em frente ao altar levantam-se, voltam para a porta e repete o circuito tantas vezes quantas as prometidas. Mantém os olhos fixos na imagem da padroeira e só os lábios a mexer denunciam a reza. As crianças, ainda sem perceber o que se passa, tentam subir para o colo das mães de braços abertos, e não percebem porque não lhes ligam nenhuma.
A promessa
Nas celebrações religiosas, as mulheres vestem quase todas o mesmo, como se usassem uma farda. A roupa de-ir-ver-a-Deus resume-se a um pano estampado com motivos religiosos enrolado à cintura que serve de saia, os cabelos cobertos com um lenço e uma camisa ou t-shirt brancas.
Promessa perdida
No adro, pequenos rectângulos de papel brilhante espalhados ao acaso reflectem o Sol do final do dia. São fotografias dos entes queridos que se perderam na confusão. Talvez a Mamã Muxima tenha atendido as preces.
Boa tarde!
Faz um mes que descobri este blog através do Diario da Africa ou Pé na Africa, não lembro mais , mas, estou lendo todos desde março de 2008, gostei muito é leitura diária, não vai mais retornar a Afica? seus textos são muito bons, vou continuar lendo todos até o fim.
Felicidades
Valter
Hei-de regressar, nem que seja para rever os amigos que cá ficam. Ainda não sei é quando.