Salvem a tabuada
Afonso Loureiro
Numa época em que se tecem elogios aos magalhães (com letra minúscula, para não desonrar os que merecem a maiúscula) e as calculadoras electrónicas desde o jardim infantil, talvez não fique bem defender a tabuada ou, já agora, cálculos no papel.
É importante dominar a tecnologia do nosso tempo mas, por outro lado, não nos podemos deixar dominar por ela. A partir do momento em que deixamos de saber como funcionam os botões onde carregamos, a única pessoa realmente importante na nossa função é quem programou o botão, nós podemos ser substituídos por um macaco amestrado – ou por um estagiário, que sai mais barato e reclama menos.
Falo na tabuada após um episódio triste a que assisti no supermercado. Eu e a Cristina fomos comprar, entre outras coisas, leite. No tapete rolante da caixa colocámos cinco paletes de seis pacotes. A menina da caixa, para não ter de passar todos os pacotes pelo leitor de códigos de barras, resolveu, e muito bem, contar o número de pacotes. As contas eram muito simples: cinco vezes seis – trinta! Até custa a pensar nesta conta sem o ritmo da lengalenga da tabuada.
Calculadora da década de 1920
Infelizmente, a menina não sabe a tabuada, por isso, tocando com o indicador em cada um dos pacotes, contou-os um a um. Fiquei estupefacto. Já me custava que as operadoras de caixa tivessem de encarar um cartaz que lhe diz «Sorria para o cliente – Agradeça», tratando-as como imbecis. Mas custa-me ainda mais que passem a confiar tanto na máquina que lhes faz as contas que até esqueçam a tabuada, esse anacronismo.
Deixe uma resposta
Nota: Os comentários apenas serão publicados após aprovação. Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados de imediato.