Pobre Língua-Pátria
Afonso Loureiro
Descobri, finalmente, as verdadeiras razões para a ratificação do acordo ortográfico (que não merece maiúsculas). Não é uma conspiração dos vendedores de dicionários para vender o mesmo produto duas vezes, é apenas cirurgia plástica, hoje tão em voga, com lipo-aspiração localizada a algumas consoantes ditas mudas, mas que não o são verdadeiramente. Infelizmente, tal como acontece na cirurgia plástica, por vezes deixamos de reconhecer a pessoa.
As palavras não se lêem letra a letra. Apenas soletramos as que não conhecemos, porque as restantes, memorizamos a forma dos altos e baixos, pintas e tracinhos e lemos o alfabeto latino como se de ideogramas se tratassem. Ao retirar letras, a forma das palavras muda e os textos tornam-se mais difíceis de ler. Paramos muitas vezes para soletrar palavras que já conhecemos.
O c de facto e acto, apesar de não se pronunciar, marca o ligeiro prolongar do a em fato e ato. Sem a letra quase-muda as palavras perdem a forma.
Por outro lado, se a lipo-aspiração já está pronta a entrar em força, a moda das mamas de silicone chegou há muito. A língua-franca actual começa a entrar à martelada nos jornais e no discurso corrente, substituíndo palavras portuguesas por maus equivalentes em inglês, ou até mesmo com expressões idiomáticas aportuguesadas que nos fazem escorrer suores frios pelas costas.
Bonita vai a língua, com o h de humidade extirpado, por poder ser confundido com gordura, mas com uns belos implantes em inglês, para compôr o back-office.
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