Caminhos-de-ferro com nome de rios
Afonso Loureiro
Muitas das primeiras linhas de caminho-de-ferro no norte de Portugal foram construídas à beira de rios. Seguiam as velhas estradas que se lhes colavam às margens, nas quais das vilas e cidades se situavam. As linhas mais curtas, que acompanhavam um rio da foz até quase à sua nascente, herdaram o nome do curso de água. Eram estas as linhas que ligavam as grandes rotas do litoral às sedes de município do interior, como ramos cada vez mais finos de uma árvore enraizada em São Bento ou Santa Apolónia. O seu nome remetia de imediato para a região que serviam, mas hoje linha ferroviária com nome de rio é sinónimo de linha suprimida, carris vendidos a peso e estações arruinadas.
Estação de Mondim de Basto
A sul, com topografias menos acentuadas e povoamento mais disperso, os comboios percorriam livremente as planícies na sua migração diária, buscando sempre os declives mais suaves. Aqui, as linhas esqueciam os rios e ganhavam o nome das cidades das estações terminais ou da região que atravessavam. Linhas com nome de rio são quase todas no Norte, com a notável excepção da linha do Sado.
Painéis de azulejos característicos
As linhas do Corgo, Dão, Tua, Sabor e Tâmega, bem como grandes troços das linhas do Vouga e Douro, entre outras, já não funcionam. Faltam comboios e, em muitos casos, até os carris foram arrancados para selar e lacrar o encerramento definitivo. Carris arrancados a frio e sem anestesia quase sempre, e algums até mesmo roubados à descarada. Algumas foram encerradas assumindo que assim seria, mas outras tiveram um processo de fecho eivado de má-fé. «Vamos fazer obras de conservação», diziam. «Encerra-se a linha por uns meses e depois volta a funcionar com mais comboios e melhores horários», acrescentavam. «Tiramos os carris velhos e pomos novos». Passados alguns meses, as obras paravam e os comboios desapareciam. «Agora já não vale a pena. Sem carris nem comboios, mais vale fechar».
Abandono
A solução de recurso, que garantem ser milagrosa, é transformar a linha numa ciclovia. Aproveitam-se os fracos declives para tornar o passeio de bicicleta mais agradável e finge-se que não se desperdiça o património nem se fecha a via de comunicação, mas não é com ciclovias que se combate a desertificação do interior.
Um padrão característico no processo de encerramento de quase todas estas pequenas linhas foi a da supressão das composições mais concorridas e a falta de manutenção dos comboios. Reduzindo a oferta reduz-se a procura e, com a procura reduzida, justifica-se a falta de rentabilidade e a inevitabilidade do encerramento – pescadinha-de-rabo-na-boca. Curiosamente, a decisão de encerrar linhas começou a ser tomada no auge do cavaquismo, em que o sucesso do governo se media em quilómetros de auto-estrada pagos com fundos europeus. Talvez houvesse que justificar a necessidade de novas estradas por não haver linhas férreas suficientes…
Caminhos-de-Ferro do Estado
A imagem que melhor define o sentimento invocado pelas linhas abandonadas e esventradas é a das estações arruinadas com os painéis de azulejos mostrando cenas da vida rural de cada região entregues ao vandalismo. Lá em cima, coroando este quadro de abandono, lê-se «Caminhos-de-ferro do Estado» – é a legenda apropriada, que descreve perfeitamente o estado do Estado.
Boa noite, sou entusiasta das linhas ferroviárias e considero a sua página interessante.
Estou a contactá-lo, por esta via, porque não consigo aceder ao seu correio electrónico.
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Obrigado
Rui Ferrinha