Amor-ódio
Afonso Loureiro
A relação de Angola e dos Angolanos com Portugal e com os Portugueses é algo de muito esquisito.
Por um lado, há um ódio institucional à potência colonial, ao colono e a tudo o que remeta para os cinco séculos que antecederam 1975. Muitos Angolanos dizem que o colono era feio, mau e comia criancinhas. Alguns dizem mesmo que Angola só está assim, neste buraco, por causa do colono, que só cá veio roubar.
Por outro lado, dizem-me que no tempo do colono é que as coisas funcionavam. Que não havia assaltos nem bandidos. Que, nessa altura, Luanda estava limpa e a electricidade não faltava todos os dias. Dizem-me que os Portugueses calculavam tudo e que as casas não caíam.
Portugal continua a ser uma referência para muitas coisas. Os restaurantes em Luanda quase todos servem comida portuguesa. O vinho é considerado bom se vier de Portugal, mesmo que seja o pior carrascão do mundo. Para temperar a comida, é frequente ver latas de azeite e óleo com a inscrição “Tempero Português”. Os supermercados abastecem-se de produtos portugueses e, às vezes, sul-africanos.
Carrascão Tuga
Há Angolanos que foram doutrinados desde pequenos a odiar Portugal e o tempo colonial. A sua maioria tem agora perto de vinte anos. Sabem de cor e salteado todas as atrocidades cometidas pelos portugueses desde que Diogo Cão chegou ao Rio Congo e são incapazes de apontar coisas boas. É um pouco à semelhança daqueles que apenas são capazes de apontar os defeitos do regime de Salazar.
Os mais velhos são críticos dos dois períodos. Apontam defeitos e virtudes ao regime colonial e à Angola independente. Falam dos contratos, que roçavam a escravatura. Falam da falta de condições actual. Lamentam que a política se tenha sobrepujado ao bem-estar das pessoas.
Durante a campanha eleitoral, havia uma candidata, a “Mamã Coragem”, que fazia uns discursos saudosistas do passado, elogiando o tempo colonial e criticando o Governo. Dizia que, se os angolanos soubessem como era a vida no tempo colonial, se revoltariam por viver no meio do lixo e da pobreza. É uma figura histórica da libertação de Angola e acabou por não ser eleita. Talvez tenha sido demasiado incómoda.
Depois da Independência, muitas cidades mudaram de nome. As cidades brancas ficaram com o nome das cidades negras que as rodeavam. Algumas passaram a ser chamadas pelos dois nomes. A ordem com que são referidos ainda é um pouco aleatória.
O Português, como branco, é visto como explorador. Como Português, é um símbolo de tempos menos difíceis. É uma dicotomia interessante…
Mas, às vezes, no meio de tanto mal-dizer do colono, há coisas que me deixam boquiaberto. O antigo governador da província de Cabinda foi destacado para o Bié, no interior. Lançou uma campanha de obras para recuperar a cidade do Cuíto, que foi destruída na guerra de 1992-2002. Em Outubro de 2002, o Presidente da República foi lá ver o andamento das obras. Fez um discurso onde prometeu que o Cuíto havia de voltar a ser como Silva Porto! Em que ficamos, Zé Dú?
in Semanário Angolense nº281
As pessoas serão sempre pessoas, seja no nosso paraíso à beira mar plantado, seja no coração de África.
Nunca ninguém é feliz com o que tem.. Já dizia o meu avô que “a galinha da vizinha é sempre melhor que a minha”.
grande abraço de quem anda a por a leitura em dia ;P