Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

13  10 2008

Pensava eu que estava acabado…

Afinal não.

Quando me mudei para este primeiro andar das Ingombotas, passei algumas noites mal dormidas por causa de umas obras de Santa Engrácia debaixo da janela.

Durante umas semanas tive chineses e brasileiros a abrir uma vala de cada lado da rua e a repavimentar as bermas. Só trabalhavam de noite, porque de dia o trãnsito não podia parar. No final da obra lá perceberam que o trânsito tinha mesmo de ser cortado ou então nunca mais acabavam mas, no entretanto, pegavam perto da meia-noite e largavam um pouco antes das seis, para não serem alvo da ira de gente com olheiras e mau humor.

Lembro-me de ter achado bizarro que se tivesse recuperado uma faixa de um metro de largura de cada lado e que os lancis continuassem partidos. Já tinham reabilitado passeios noutras ruas, mas parecia que se tinham esquecido da nossa.

Parecia, porque não esqueceram. Três meses depois, a sinalização provisória e as proibições de estacionamento regressaram. Começaram a partir os lancis antigos para dar lugar aos novos. E sim, tal como em Portugal, a primeira coisa que fizeram foi rebentar com a faixa de asfalto nova. Já nem pergunto porquê. Tal como o sonho, é uma das constantes da vida. Asfalto novo implica vala nova!

Mas por falar em constantes da vida. Parece que as constantes da vida são mutuamente exclusivas. Não consigo sonhar quando, às duas da matina, está um senhor a manobrar, cheio de mesuras, um martelo pneumático. Felizmente que partir o que está feito é rápido e num ápice foi incomodar outras janelas.

Suspirei de alívio e virei-me para o outro lado. Agora podia dormir em paz. O barulho já tinha acabado. Pensava eu.

Nem dez minutos se passaram até chegar um carro com o rádio em altos berros. Música cheia de batuques e letras de ganstâ com bwé d’estilo. Estacionou no lugar que antes estava ocupado pelo lancil. Os passageiros saíram e ficaram o resto da noite a beber cervejas em frente ao salão de jogos, o tal que fica debaixo da minha janela, e a ouvir o rádio do carro. Como a música estava alta, gritavam uns com os outros. Que mal fiz eu? Foram-se embora às cinco e meia. Levantei-me às sete…

Desta vez nem fui capaz de apreciar as propriedades hipnóticas do leite em pó. Já o misturo de olhos fechados. Uma colher de açúcar, duas de café, duas de leite e água q.b. Um minuto no micro-ondas e depois é só beber.

Quando saí, havia latas de Cuca por todo o lado. Entre a porta do prédio e o carro, que estava mesmo em frente, contei dezasseis! Mais haveria, mas as olheiras não as deixaram ver.

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

Uma resposta a “Pensava eu que estava acabado…”

Nota: Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados.
  1. Se se preocupassem em reparar as estradas do Prenda é que era!

Deixe uma resposta

Nota: Os comentários apenas serão publicados após aprovação. Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados de imediato.

« - »