As saudades que eu tinha
Afonso Loureiro
De ver o amanhecer do lado certo da cama, logo a seguir a ter dado uma cabeçada na cabeceira.
De ver o Sol baixo no horizonte a meio do dia.
De não ver seguranças armados a cada esquina.
De conduzir o Patrol.
De não ter de me certificar que a rede mosquiteira está bem fechada.
De poder beber água da torneira.
Da almofada com a altura certa.
De andar na rua sem ter de espreitar por cima do ombro.
De comer melão.
Dos ruídos que os degraus lá de casa fazem. Do chiar da porta do quintal. Do clac da fechadura do meu quarto e do interruptor do quarto com o seu som metálico.
De procurar umas geocaches. De elogiar as boas e reclamar das más.
De ter um rafeiro a morder-me as mãos e a bater-me com o rabo na cara.
Do barulho da chave a entrar na fechadura.
Dos bolos da Marianita.
De não suspeitar de cada polícia.
De ter electricidade e água todo o dia.
Dos livros! De todos eles, até dos que não gostei.
Mas, acima de tudo, do cheiro e do toque dos que mais me enchem o pensamento quando estou lá longe!
Afonso,
No Brasil temos uma música que diz: saudade mata a gente.
Quando voltei ao Brasil, há três semanas, senti falta de Angola. Agora que voltei a Angola, sinto falta do Brasil.
Será nossa sina?
Eu também tinha muitas saudades tuas claro e na verdade a saudade mata mesmo (percebo tão bem isso agora).
Bem vindo à civilização! Quando te pomos a vista em cima a ver se ainda falas português?