Balanço
Afonso Loureiro
Nos últimos dias tenho retomado o contacto com os que deixei na metrópole. Todos me pedem novidades, querem saber como me estou a adaptar, se estou a gostar.
É óbvio que acabei por repetir muitas vezes as mesmas palavras. E, de cada vez que as dizia, ouvia-as. De tanto as ouvir, passei a prestar mais atenção ao seu significado. Porque teria eu escolhido aquelas palavras? Porque não outras?
Se é verdade que aprendemos mais quando ensinamos, consolidei o que já conheço de Angola de cada vez que descrevia a minha experiência de expatriado.
Porque me fartei de citar os maus exemplos, a pouco e pouco, dei por mim a odiar Angola e a sua arrogância oficial mesquinha, o racismo omnipresente e as retaliações terceiro-mundistas de um país que ainda não pode servir de exemplo para muitas coisas.
Venho mais branco. Por fora e por dentro. Por fora porque não tenho apanhado Sol. É ridículo, mas fui para África e volto menos queimado do que se estivesse cá. A insegurança leva-nos a ficar mais fechados nos nossos casulos – a casa e o carro. Os dias passam-se a trabalhar dentro de quatro paredes e o Sol só o vemos de manhã ou ao fim da tarde.
Venho mais branco por dentro porque a todo o momento sou recordado da minha condição de Pula, de representante do colono, de laton. O racismo que se respira em Angola é terrível e contagioso, da mesma maneira que sou visto como um mealheiro com pernas, às vezes dou por mim a pensar «pretos dum raio…»
No esforço para mostrar que não há racismo em Angola, há quem aponte que dos cinco escritores angolanos mais lidos, dois são pretos, dois são brancos e um é mestiço. Não seria mais simples dizer que são cinco escritores angolanos?
Maus exemplos há em todo o lado, concluí. Em Angola há gente boa e gente menos boa. Oportunistas e vigaristas. Corruptos e honestos. Tal como noutras paragens, são sempre os maus exemplos que se destacam.
Depois de uns dias a odiar Angola e todas as suas coisas más, caí em mim. Não me posso focar nos podres. Tenho de passar a apreciar mais os frutos doces de uma terra maravilhosa que, como tudo, tem as suas imperfeições. Tenho de deixar de encolher os ombros de incredulidade com os complexos de inferioridade africanos que se traduzem em prepotência. Em vez de escolher as palavras negativas, de relatar os polícias que se subornam com 500 Kwanzas ou das burocracias supra-kafkianas, tenho de passar a usar as que mostram os bons exemplos. E depois talvez dê por mim a pensar na razão que me levou a escolher aquele bom exemplo e não outro qualquer.
Os técnicos angolanos lá da empresa são o nosso orgulho. São a prova de que a próxima geração não está perdida. Sempre que penso neles, retomo a esperança no país. Sinto-me com vontade de lutar pela terra que é deles.
Os esforços desenvolvidos na reconstrução nacional, mesmo que às vezes envoltos num faraonismo inconcebível, hão-de dar frutos. As estradas que se vão recuperando de forma expedita e pouco duradoura irão aumentar os níveis de exigência das populações, que não aceitarão que a situação volte ao tempo da guerra. Uma vez reaberta a estrada, terá de ser mantida.
África marca fundo. É uma experiência de vida incrível. Lá não há situações a preto e branco, nem mesmo no racismo. Tudo são matizes e gradações. Uma aparência simples esconde complexidades extraordinárias. Começo a compreender os que falam dela com o olhar no infinito e o coração cheio de saudade. Os poucos meses que lá passei já me mudaram. Sei que sou diferente do que fui.
Angola, terra de contrastes. Até no meu âmago me deixa dividido.
Nota-se que Angola mudou a tua vida e acredito que é uma experiência de vida marcante. Neste momento tudo é comparado a Luanda para o bem e para o mal.
Muito honestamente nunca me passou pela cabeça qualquer comentário que envolva a cor da pele. Nem quando há dias um grupo, ao cruzar-se connosco na rua, nos brindou com o rótulo de estrangeiros. Em todos os países há quem entenda que a culpa do que corre mal é dos que vêm de fora.
Agora, que a polícia e função pública são a maior areia da engrenagem, e que os controladores são uma gente que não interessa a ninguém, é um facto.
E sim, os “nossos meninos (e a nossa menina)” são o símbolo da nossa esperança neste país.
Alô Luanda, Setúbal escuta!?
Essa de ires para aquelas latitude e voltares mais branquinho. Para quem não o tenha visto neste dias eu afirmo: É o Afonso mais branco dos últimos doze anos (pelo menos)!!!
Nem quando estiveste enclausurado semanas a fio a estudar para Análise IV e Geodesia estavas nesse estado!!!
Tens que procurar uma praia tipo “Troia”. Cuidado é com os outros banhistas…verifica duas vezes antes de te deitares de barriga para baixo… 😀
Ah, claro… não deixes o Radical enterrar o pacote do leite na areia. Naquelas latitudes as correntes são tramadas!!!
P.S. Estava muito sério isto…
P.S.2: Muito fixe este espaço Afonso! KEEP UP THE GOOD WORK!!!!
😀
Aqui é mais a lata de Nido. Leite “a sério” é raro… 😛