Brisa nas Pétalas do Lótus Perfumado
Afonso Loureiro
Num hotel angolano, recentemente construído e equipado por uma empresa chinesa, encontrei os confortos esperados naquela categoria de alojamentos. Toalhas limpas, televisão e ar condicionado.
Infelizmente, os chineses que o equiparam, fizeram-no para outros chineses, esquecendo-se de que há outras pessoas no mundo para além dos outros chineses. Poucas, mas há. Quando agarrei no comando do ar condicionado, para fazer descer a temperatura do quarto para algo civilizado, deparei-me com um enigma.
Aparelho confuciano
Só reconheci três botões. Um, rosa e redondo, só poderia servir para ligar e desligar. Dois outros, triangulares deveriam permitir regular a temperatura. Quanto aos restantes… só adivinhando.
Suponho que os caracteres chineses que os ornamentavam poderiam indicar funções desconhecidas no mundo ocidental mas muito apreciadas no Extremo Oriente. Fui carregando nos botões, procurando descobrir o que cada um fazia. O aparelho na parede apitava e rangia a cada comando, mas com efeitos práticos escassos.
Assumi que haveria diminutas diferenças entre cada modo de funcionamento. Tão diminutas que apenas um oriental, habituado a lidar com uma míriade de interpretações e significados de cada palavra ou gesto, consoante o contexto, entoação, hora do dia, cor das meias da vizinha do lado ou estado de embriaguez, seria capaz de delas se aperceber. Para um ocidental, acostumado a uma menor subjectividade e incapaz de compreender as aplicações das filosofias orientais às máquinas de ar condicionado, pareceu-me que continuava só a soprar ar frio com intensidade moderada. Se calhar, numas vezes soprava ar um-pouco-menos-frio-que-o-ar-frio, com intensidade-quase-quase-moderada e, noutras, ar um-bocadinho-antes-de-se-poder-chamar-morno, com uma intensidade-que-umas-vezes-parece-forte-outras-não.
Respirei fundo e deixei que todas as energias místicas do singelo comando que empunhava me invadissem. Percebi que seria necessário acertar na combinação correcta de teclas para notar diferenças.
Como não tinha dicionário que me ajudasse, tentei interpretar o melhor que pude as aragens que emanavam da máquina e comparar com o que lia no comando. Dei por mim a encarar ventos quentes ou frios, misturados com ar húmido ou seco. A minha, tradução para algumas das teclas, foi a seguinte:
Temperatura |
Humidade do ar |
Velocidade do ar |
Direcção do ar |
Modo |
Frio |
Seco |
Moderada |
Tecto |
Gentil Descanso do Panda Dourado |
Muito Quente |
Muito seco |
Cuspido com violência |
Variável |
Grande Sopro do Dragão |
Fresco |
Normal |
Variável |
Tecto e chão |
Suspiros Afortunados na Floresta de Bambú |
Morno |
Normal |
Muito baixa |
Chão |
Delicados Zéfiros Agitam os Juncos |
Quente |
Húmido |
Baixa |
Tecto |
Verão Auspicioso |
Frio |
Muito húmido |
Média |
Variável |
Doce Fluir do Rio Amarelo |
Gélido |
Muito seco |
Alta |
Chão |
Majestoso Leão Branco do Norte |
Frio |
Muito húmido |
Muito alta |
Variável |
Batráquio Enfurecido |
Acabei por me decidir pela Brisa nas Pétalas do Lótus Perfumado. Tive uma noite descansada!
lol FABULOSO!
Genial!!! Em breve seremos todos obrigados a aprender chines.