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02 2009

Feitiços na Ilha de Luanda

Aquela língua de areia que abraça Luanda, minúscula, quando comparada com Angola, é berço de muitas tradições de feitiçaria e encantamentos. A proximidade do mar e a vida perigosa dos pescadores a isso convida. Conta-se que na Ilha do Cabo há feiticeiros poderosos, capazes de trazer a prosperidade ou a desgraça. E, às vezes, até mesmo as duas em simultâneo.

Chamam-lhes os Feiticeiros das Mulembas. Quando o peixe não vem e os pescadores reclamam, executam os seus rituais, enfeitiçando as ondas e o mar para que tragam os peixes de volta às redes. Mas não fazem só o bem. Por vezes, usam as suas magias para virar barcos e afogar os pescadores. São respeitados e temidos pelos poderes que possuem.

Para além destes feiticeiros, existem também as Mamãs Bessanganas, outras figuras importantes, que são sempre referidas em voz baixa e deferente. Ninguém as quer ver ofendidas. Mais vale prevenir. Essas falam directamente com a Kianda, sem precisar de marcar hora. Desgraçado do pescador que ofender uma. Não volta ao mar. Se o fizer, a Kianda puxa-o do barco e afoga-o. Se não o fizer, morrerá com moléstias várias e dolorosas.

Distinguem-se pela roupa e pelo lenço amarrado à cabeça. Quando peço mais pormenores, dizem-me que as Bahianas se vestem da mesma maneira. O culto a Iemanjá nasceu aqui, nas Mamãs Bessanganas…

Nos seus rituais, que envolvem sempre muita música e alguma bebida forte, é costume que algumas sejam possuídas pelo espírito da Kianda. O mar entra nelas e elas entram no mar. Nessa altura estão a xinguilar, agitando-se no chão, revirando os olhos e gritando palavras desconhecidas. Língua do mar, talvez.

Contaram-me a história do taxista que atalhou caminho pela areia, atropelando redes e alguidares de peixe. Conseguiu ultrapassar meia-dúzia de carros, mas teve a pouca sorte de ter afrontado uma das Bessanganas, que logo lhe lançou uma onda poderosa em jeito de vingança. O rapaz começou a sentir-se mal, a ter dores pelo corpo, a vomitar e a largar cabelo. Poucos minutos depois, morreu. Serviu de exemplo para os que não respeitam as tradições da Ilha…

Acerca do autor

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Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

Uma resposta a “Feitiços na Ilha de Luanda”

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  1. A mesma ilha que conheci. Passados quase 40 anos, quase duvido que seja a mesma. São outros tempos. São outras gentes. Como não são figuras para turista ver (como na Baía) … não consigo nem imaginar agora, no que se tornou esse fiozinho de areia que ainda invade o oceano, criador de uma linda baía. Um táxi irrompendo pelo areal?!?
    Até.

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