No fim, só pode haver um
Afonso Loureiro
Em meados da década de 1980 foi feito um filme que contava a história de um grupo de homens especiais. Viviam sem medo da morte ou da doença e até mesmo as feridas mais graves lhes eram indiferentes.
O seu único receio era que lhes separassem a cabeça do resto do corpo. Nessa altura morriam, finalmente. Os Imortais, como lhes chamavam, por vezes lutavam entre si. Sabiam que o último sobrevivente destes duelos conseguiria poderes e conhecimentos extraordinários.
O Imortal mais famoso é, concerteza, Duncan MacLeod, mais conhecido por Highlander, uma vez que nasceu nas terras altas da Escócia.
A maioria dos imortais passava despercebida. Viviam como pessoas normais, tinham empregos, amores e dissabores. A história contada pelos filmes diz que no fim sobrou apenas um, mas quem vive em Luanda sabe bem que isso não é verdade. E sabe também que aquilo que se acreditava serem personagens de ficção é apenas a realidade. Os Imortais existem. E estão todos em Luanda.
A esposa de um amigo, espírita encartada e capaz de descobrir estas coisas facilmente, reconheceu-os logo nos primeiros dias na capital angolana.
Deslocam-se a alta velocidade, equilibrados em minúsculos ciclomotores ruidosos e irritantes, fazendo razias, tangentes e até secantes a tudo quanto circula na estrada. Por vezes são comparados, em temeridade, aos motoristas dos candongueiros, mas o sorriso com que encaram a morte certa mil vezes por dia, coloca-os numa classe à parte. Com o total desrespeito que têm pela vida só podemos concluir que não temam a morte, que sejam imortais, os verdadeiros Imortais!
Imortal!
Agora, sempre que um kazucuta passa na estrada a fazer malabarismos na roda traseira ou a buzinar furiosamente enquanto passa, em contra-mão, entre duas filas do engarrafamento perpétuo de Luanda, só me ocorre dizer «Lá vai um Highlander!»
É pena que estes não estejam informados acerca das tradições dos Imortais. Se desatassem a cortar as cabeças uns aos outros, no fim sobrava só um e esse incomodaria muito menos.
nossa, afonso, essas histórias me dão um tanto de saudade e mais outro tanto de tristeza. será que os miúdos que pintam barbas serão homens o suficiente pra mudar esse país?
um beijo da ex-branquela d’angola
Só posso esperar que sim…
Não é preciso ir à Escócia para encontrar essas crenças. Em 61 muitas cabeças foram aí cortadas para garantir a morte aos “Imortais”.
http://quitexe-historia.blogs.sapo.pt/18052.html
João Garcia