Yanick, o presidiário
Afonso Loureiro
O nosso chato de serviço cá do prédio andou ausente por umas semanas. Foi um descanso. Mesmo morando no anexo das traseiras e tendo quem o sustente, não desistia de pedinchar dinheiro para o mata-bicho, para a sopa ou para a cerveja.
No início de Maio voltei a vê-lo. Estava baço e apagado. Falava baixinho e encolhido, como se não quisesse ser visto ou ouvido. Tinha peladas na cabeça, mostrando uma cabeça rapada com pouco cuidado e feridas nos nós dos dedos.
Contou—me que tinha feito um disparate e, por isso, prenderam-no por 28 dias. Enquanto olhava por cima do ombro, sentou-se num degrau das escadas. Deve ter sofrido na prisão com a sua atitude de gabarolas. As feridas nas mãos eram sinais das últimas lutas lá dentro.
Depois de se encostar à parede e voltar a espreitar por cima do ombro, desabafou: «Estava um homem a discutir com o meu padrinho e eu parti-lhe o espelho do carro… fui preso.»
Dei-lhe dinheiro para comprar um antibiótico para as feridas infectadas nas mãos e recomendei que não o gastasse em cerveja.
Umas semanas mais tarde, as mazelas do corpo estavam curadas, mas as do espírito desconfio que vá demorar mais tempo.
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