Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

20  07 2008

Rosa

Por uma razão ou por outra, fiquei uns dias sozinho em casa. Aproveitei para por em dia umas sestas que estavam já dadas como incobráveis e para engomar a pilha de roupa que tinha vindo a adiar. As sestas correram muito bem. Superaram mesmo as minhas expectativas. Já a parte do ferro de engomar teve uns resultados mistos, para não dizer que não foi mau de todo. A roupa ficou passada, mas há um ou outro vinco que acabou por me derrotar. Com barulho das luzes ninguém nota.


Um Toyota na publicidade

Aproveitei também para fazer mais uns passeios higiénicos pelo bairro. Voltei a visitar o edifício da Assembleia Nacional que no Domingo tinha um sujeito atravessado à porta. Nos dias de expediente ganha uma nova dignidade, imposta pelos dois polícias. Em frente da escola de condução tropical (no Cinema 1º de Maio) havia uma dúzia de vendedores de estampilhas fiscais e impressos para outra dúzia de candidatos a condutores. Havia também uma vendedora de livros. Dei uma espreitadela aos títulos e achei piada à disposição das obras. “Noções de Mecânica”, “Código de Estrada”, “Código Penal Angolano”, “Bíblia Sagrada”.


Vendedora de água fresca

A venda na rua aparenta ser estática, mas não é. Os rapazes que vendem entre os carros estão sempre a andar. Fazem vinte metros contra o trânsito e depois regressam depressa ao ponto de partida. As vendedoras de fruta estão quase sempre sentadas, mas de vez em quando agarram no alguidar, põe-no à cabeça e mudam a loja para uma esquina mais movimentada. É um pouco ingrato mirar um abacaxi com bom ar e, quando se regressa, uns minutos depois, o abacaxi foi-se com a vendedora. Até mesmo as vendedoras de ovos cozidos, bolos e sandes estão sempre em movimento. Param apenas para atender um cliente ou para aproveitar um local concorrido. Só mesmo quem depende dos fogareiros para cozinhar é que se mantém, dia após dia, no mesmo local.


Peixaria

O panorama fora do centro da cidade é muito diferente. No Morro Bento, lá mais a Sul, as bancas de fruta e hortaliças são imensas. São verdadeiras lojas. As margens de lucro destas vendedoras já não são consumidas pelo táxi de volta a casa e a variedade de produtos aumenta muito as vendas.


Mercearia

No fim-de-semana fomos dar uma voltinha para fora da cidade. Já nos estávamos a armar em portugueses típicos, que vão passar o fim-de-semana ao centro comercial. Apercebem-nos do ridícula que estava a ser a nossa vida quando demos por nós a cumprimentar outros portugueses que só conhecemos de vista do centro comercial.


Vida de cão

Soube tão bem arejar o espírito e ir ver uma Luanda sem casas e sem gente, com o Mussulo a molhar os pés ao nosso lado. Mas isto é tema para outro dia. Hoje é para falar da Rosa.

No regresso a casa tínhamos de ir às compras. Havia já muitas falhas em casa. Como as cebolas do supermercado tinham aspecto de já ter tido uma juventude preenchida algures no século passado, seria melhor pensar em ir a outro sítio. Resolvemos parar numa das muitas bancas de verduras. O critério de escolha foi inexistente. Parámos na primeira que não tivesse clientes. Os produtos estavam com muito melhor aspecto. Os tomates viçosos, os pimentos brilhantes e as cebolas tinham aspecto de cebola. Não eram aquelas coisas moles que vimos lá no supermercado.


Cada par de laranjas 50 Kz

Ao contrário das vendedoras do centro de Luanda, que vendem duas laranjas de cada vez, aqui vende-se em maior quantidade. À excepção dos pimentos, que estavam empilhados quatro a quatro, o resto era vendido a balde. Apesar de não sermos, claramente, angolanos de gema, os preços não reflectiam o imposto de branco. O preço que a vendedora nos fez para o balde de tomates foi o mesmo que fez ao cliente anterior.

Um balde de tomates era muito. Somos só três e não gastamos assim tanto. A vendedora bem insistia para que levássemos um balde inteiro, que não se estragava no frigorífico, mas era realmente muito tomate. Resolvemos comprar só duas mãos cheias. O preço foi um pouco regateado, mas depressa se chegou a acordo: 200 Kz por 8 tomates com excelente aspecto. Mais um balde de batatas e outro de cebolas, quatro pimentos (uma pilha) e uma dezena de maracujás. Ficou tudo por 2500 Kz. Pode parecer caro, mas no supermercado só havia coisas podres ao mesmo preço.

“Se as coisas forem boas, voltamos para comprar mais” avisou a P..

“Sim, é tudo bom.”

“Como se chama?”

“Rosa!” e brindou-nos com um sorriso.

Até à próxima!

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

Uma resposta a “Rosa”

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  1. Acho que a Rosa ganhou três bons fregueses.

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