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31  08 2009

Maravilha da Física – Entropia negativa

Desde que se começou a olhar para o mundo com equações matemáticas, tentando desvendar os seus segredos mais íntimos segundo o racionalismo newtoniano, ainda que às vezes salpicado com alguma alquimia, que se percebeu que a desordem é a natural evolução das coisas. A entropia, que mede a desordem, apenas sabe crescer. O futuro do Universo que conhecemos é uma massa homogénea totalmente desorganizada.

Angola é um país que pode ser descrito como um sistema de elevada entropia, tal é a desorganização que encontramos a cada esquina. Por outro lado, podemos concluir que Angola segue na linha da frente em direcção ao futuro inevitável – isto é que é progresso!

O sonho de todo o Físico teórico, experimental ou assim-assim é descobrir a forma de inverter a entropia. Quem o fizer ganhará não só o Prémio Nobel, como o agradecimento de todos os construtores de castelos de cartas com gatos em casa.

Por todo o mundo se gastam rios, ou melhor, oceanos de dinheiro em novas máquinas e experiências complexas para encontrar pistas que levem à descoberta de formas de abrandar a entropia. Aceleradores de partículas ou laranjas de Silves, detectores de neutrinos e bosões provavelmente inexistentes, contadores de gatos de Schrödinger ou compactadores de lixo e máquinas de transformar porcos em salsichas, tudo serve para a pesquisa. Resultados práticos após mais de um século de experiências – nenhuns, nem sequer uma máquina de transformar salsichas em porcos. Apenas um considerável aumento da entropia nas bibliotecas e arquivos onde se acumulam as teses sobre o assunto.

Mas os angolanos, que já se viu, estão muito à frente da maioria, escondem um segredo tremendo. Inventaram a máquina da entropia negativa! Como todos os segredos desta magnitude, deve estar abrigado do olhar cobiçoso dos estrangeiros. O melhor lugar para o esconder, é a sede do Departamento de Estrangeiros e Fronteiras, por razões óbvias.

Para ajudar a disfarçar, está camuflada de forma a que se confunda perfeitamente com o que a rodeia. Assemelha-se a um normalíssimo armário arquivador metálico com quatro gavetas fundas e uma fechadura. A fonte de energia é, para já, desconhecida. Não se vislumbram cabos ou tubos a ligar a máquina a lado nenhum. Talvez seja alimentada apenas pelo constante abrir e fechar das gavetas.

Pelo que me foi dado a perceber, introduz-se um conjunto de objectos ordenados grosseiramente e, à medida que se retiram elementos e acrescentam novos conjuntos ordenados, o sistema vai-se ordenando a si mesmo, reduzindo a entropia inicial. Uma descoberta fantástica!

Como povo prático que é, os angolanos resolveram guardar passaportes nesta máquina. Agarram num molho deles e põem-nos mais ou menos por ordem numa gaveta. À medida que vão recebendo novos passaportes vão-nos introduzindo no meio dos restantes, aproximadamente nas posições certas. A dada altura chega um estrangeiro para levantar o seu passaporte. O funcionário vai procurando por ordem alfabética até chegar à posição esperada. Se o encontrar, retira-o. Se não o encontrar, quer dizer que ainda tem demasiada entropia e não encontrou o seu lugar devido. Caso a máquina não existisse, teria de verificar os passaportes um a um, mas assim, basta-lhe esperar «Volte cá amanhã». Entretanto, outros pedem os seus passaportes, fazendo variar a ordem dos documentos dentro da máquina.

No dia seguinte, o estrangeiro da véspera torna a pedir o seu passaporte. Se tiver tido a sorte de que os últimos passaportes retirados tenham feito o seu deslocar-se para o sítio devido, leva-o consigo. Caso contrário… «Volte cá amanhã». Este ciclo repete-se até que o documento chegue, finalmente, a colocar-se entre os que o deveriam ter rodeado desde o princípio.

Demonstração
A teoria

Esta máquina é fabulosa! Em vez de se desperdiçar energia à procura de uma coisa que se sabe vir a aparecer eventualmente, basta esperar pelo dia seguinte. A entropia reduz-se pouco a pouco até se anular completamente para cada passaporte e tudo isto sem qualquer esforço ou cansaço!

Penso que talvez funcione com base no princípio de que a entropia média do conjunto se mantém estável ou que cresce muito lentamente à medida que se lhe acrescentam elementos, mas que a entropia de cada elemento isolado vai variando negativamente.

Pessoas a caminhar sobre montes de lixo a arder
Demasiada entropia

Agora só espero que não deixem esta ideia desaproveitada em tarefa tão simples como gerir passaportes. Há muitos sítios em Luanda onde podiam começar a fazer umas experiências…

A propósito, a entropia do meu passaporte já foi anulada!

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

4 respostas a “Maravilha da Física – Entropia negativa”

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  1. Ha-ha-ha
    Você também podia fazer um post sobre a contribuição de Angola para o despertar de sua veia filosófica.
    Abraços

  2. Caro Afonso,

    Não será o caso, bem mais simples, de ao lado do arquivo geral se posicionar uma secretária com uma gaveta onde se refugiam estrategicamente os passaportes de mal com a ordem regulamentar?

    Um abraço.
    Elmiro

  3. Há que tentar acreditar que essa secretária não existe…

  4. Tenho um amigo, q por acaso até está cá em Angola, q usa a teoria dos anõezinhos, aqueles q ficam dentro dos aparelhos e q tiram café, dão maços de tabaco, escrevem as folhas das impressoras, etc. Quando qualquer coisa avaria é pq o anãozinho está de folga. Se calhar existem bué de anõezinhos na DEFA 😉 Todos enfiadinhos por ordem alfabética dentro dos arquivos a ordenarem os processos e a diminuir a entropia 😀

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