Aerograma

Isento de Porte e de Sobretaxa Aérea

15  02 2010

África amarela

A China resolveu sair das suas fronteiras e lançar-se no mundo capitalista em força. Estudou a fundo as regras do sistema para as poder dominar e contornar melhor que os outros. E está a sair-se muito bem.

A abordagem que adoptou para África é eficaz. Fecham os olhos a tudo o que não diga respeito ao negócio e deixam de lado eventuais escrúpulos quando chega a altura de fazer contas aos lucros.

Enquanto meio mundo reclama dos regimes ditatoriais africanos e tenta que as coisas mudem, os chineses optam por não se imiscuir na política e aproveitam a situação porque sabem que é mais fácil negociar com um ditador do que com um parlamento. Direitos Humanos são bonitos, mas nada têm a ver com negócios.

Os países ocidentais tentam estabelecer parcerias que dêem frutos a ambas as partes, tanto em termos económicos como em termos sociais. Quando se recusam a emprestar dinheiro ou a criar empresas sem contra-partidas de protecção do investimento são imediatamente acusados de adoptar atitudes neo-coloniais. Os chineses emprestam sempre e são adorados por isso.

Os chineses são actualmente os maiores credores de África. Há uns anos começaram a emprestar dinheiro sem fazer muitas perguntas. Viram em África um excelente mercado e uma reserva infinita de matérias-primas de que cada vez mais necessitam. Emprestam centenas de milhões de dólares de cada vez, não exigindo pagamento imediato nem sequer garantias concretas. Como contrapartida, terão de ser empresas chinesas a fornecer materiais e serviços ou a construir infra-estruturas.

Sabem que grande parte desse dinheiro será desviado para contas pessoais de dirigentes e administradores, que endividam o país sem quaisquer remorsos, aplicando o lema dos tempos modernos de capitalizar os lucros e socializar as dívidas. Os políticos assumem a dívida com uma assinatura, recebem a sua comissão e o resto ficará para alguém pagar.

Ao aplicar a teoria de fazer três vezes por metade do preço, conseguem asfixiar a concorrência, mas o preço final será uma vez e meia o preço justo e o prazo de conclusão três vezes o previsto. No entanto, uma vez que a gasosa foi paga têm a certeza de que não haverá reclamações.

Como o dinheiro que emprestam se destina a pagar as próprias obras que lhes são adjudicadas, é óbvio que querem poupar o máximo possível na sua execução. É frequente enviarem trabalhadores sem qualquer experiência para virem aprender fazendo. Quando dominarem a técnica regressam à China e são substituídos por outros aprendizes. A China arranjou quem lhes pagasse a formação profissional dos seus técnicos fingindo que ajuda a financiar as obras.

Obviamente que a factura será apresentada mais tarde. Se não houver dinheiro para a pagar, todos sabem que se poderá chegar a acordo e amortizar parte da dívida com contratos de exploração exclusiva de florestas, concessões mineiras ou jazidas petrolíferas.

Angola ainda está a pagar as dívidas da solidariedade proletária dos seus aliados durante a guerra civil. É uma dívida que nunca se extinguirá, como convém às partes interessadas. Agora lançou-se nas mãos dos chineses, que emprestaram muito dinheiro sem olhar a questões de política interna ou a dívidas pendentes, ao contrário do que faz o FMI.

O país podia aproveitar a oportunidade para negociar contratos com as empresas chinesas em que fosse obrigatória a integração de um número mínimo de trabalhadores angolanos, como faz com outras empresas. Podia até ser para as tarefas menores, que não exigissem qualificações especiais, enquanto não houvesse quadros suficientes. Aprenderiam e ganhariam experiência na obra, tal como os chineses fazem com os seus trabalhadores.

Infelizmente, as empresas chinesas encaram a contratação de angolanos como uma despesa adicional a evitar. O dinheiro quer-se a entrar, não a sair. Por cada angolano a trabalhar, há um salário a pagar. Por cada chinês a trabalhar, há um pagamento a receber. Como não há dinheiro para pagar este trabalhador, emprestam-no e acrescentam uma pequena comissão, também emprestada, para que não haja muitas dúvidas qual a solução mais vantajosa. Acabamos no cúmulo de ver varredores de rua chineses em Luanda. Os chineses fazem tudo e ainda pagam. Deve ser um excelente negócio para todos os envolvidos, excepto para os angolanos desempregados.

Quando a crise chegou a Angola e o Estado deixou de pagar aos seus empreiteiros, algumas empresas de construção civil despediram milhares de angolanos e repatriaram algumas centenas de quadros seus. As obras pararam até que as dívidas fossem saldadas. Não há notícia de que alguma empresa chinesa tenha repatriado funcionários ou que tenha despedido angolanos em tão grandes números. Nas obras de chineses quase só trabalham chineses. Continuaram a emprestar dinheiro para que as obras não parassem. A dívida aumenta, mas esse é um problema da próxima geração.

Sondagem
Únicos trabalhadores

O que perde Angola e África em geral, é que é uma terra rica. Enquanto houver recursos que cubram a ganância dos que a gerem e dos que a cobiçam, quem lá nasceu com a sina de ser pobre, estará condenado a sofrer.

Acerca do autor

1

Nascido no século passado com alma de engenheiro, partiu para Angola, de onde envia pequenos aerogramas.

17 respostas a “África amarela”

Nota: Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados.
  1. Boa análise. Desapaixonada. Parabéns!

  2. Desculpe, que lhe chame um néscio…Já olhou o que se passa no seu País, Portugal????`
    Se fosse a si calava-me porque de facto já disse asneiras demais, e se conhecesse a história do seu País em Angola nem a boca abria, e nem queria que dessem por si. Desculpe a linguagem, mas vá-se catar de vez!

  3. Quem não quer, não lê! Comentários anónimos que em nada acrescentam à discussão apenas revelam falta de carácter.

  4. Quer-me parecer que os 35 anos de domínio do MPLA já ultrapassaram em tolices os 5 séculos de colonização portuguesa. E é por isso que aparecem comentários deselegantes… Quem não tem argumentos, insulta!

  5. É sempre bom ouvir insultos sob nomes perfeitamente aleatórios.

    Néscios? lol

  6. Calcinhas
    Não me importa kem sejas, mas tão néscio como o tipo deste blog vou-te perguntar se sabes o que foi o estatuto do indígena de 1926, ratificado pelo Acto Colonial de 1930, a legislação sobre os indígenas do Norton de Matos, e é melhor ficar por aqui porque estar a falar com idiotas chapados, de um país que foi a vergonha em àfrica, e pelos vistos pela amostra que aqui está vai continuar a ser. Tem que chegar a altura de põr de novo certa gente a andar de Angola. Não vos serviu de emenda em 1975!!

  7. Só para que conste, o anónimo envia os seus comentários de Portugal… o que permite tirar algumas conclusões.

  8. O anónimo “Nem…”, apesar de se desfazer em desculpas, ainda não entendeu que quem se apresenta de cara lavada e alma livre não tem por que querer que não dêm por si. As trapalhadas, os roubos, os crimes e o terror perpetrados pelos governos dos países responsabilizam exactamente esses governos. E deixe que lhe diga que mesmo tratando-se de jovem aprendiz (34 anos) o governo do mpla já leva uma história bem pesada. Não se esconda “Nem…”, isso não o responsabiliza a si. Ou responsabiliza?

    Um abraço, Afonso.

  9. Sugiro que o comentador que tão elegantemente classifica os outros leia uma história de Angola escrita por não portugueses.

    “História de Angola” de Douglas Wheeler e René Pélissier, edição de Novembro de 2009, Edições Tinta-da-China, Lisboa, Portugal.

    Estão lá todas as barbaridades da colonização portuguesa e já na parte final as barbaridades dos ditos libertadores, EME’s e quejandos.
    E não me venha dizer que se trata de um livro encomendado pelos portugueses.
    E já agora para quem me chama néscio e no fundo mostra uma grande falta de educação, cultura e conhecimento do que é a história da humanidade, talvez fosse interessante alargar os seus horizontes e avaliar a história do império romano particularmente no que se passou na Península Ibérica.
    Não pretendo com isto “limpar” a colonização portugues, mas tão somente que seja avaliada na sua perspectiva histórica. Todas as colinizações são violentas e castradoras das liberdades dos colinizados, mas daí a dizer-se que a colonizaçao portuguesa foi a pior… Contudo, concordo consigo se for para dizer que os portugueses não massacraram suficientemente os nativos como o fizeram os ingleses na América do Norte, na Austália e na Nova Zelândia. Nessa óptica é evidente que os portugueses foram bem fracos. E inda por cima não vieram hipocritamente pedir desculpa pelas barbaridades passadas. Dá jeito pedir desculpa quando os maltratados foram todos “limpos”. Também dá jeito falar-se do internacionanlismo dos regimes que apoiaram o EME e que depois se verificou serem aqueles onde houve maiores violações dos direitos humanos. Aliás, temos todos de concordar que a China é um paraíso democrático e um exemplo de liberdade e respeito pelos direitos humanos. E que a sua actuação em África é desinteressada e se destina a proteger o povo “irmão” de Angola. É só gente viruosa como o camarada “Nem…”.

    Camarada “Nem…”, que no fundo não passa de um Sipaio do MPLA, cresça e apareça.

  10. Epá, isto é manual de ressabiados.

    Acho que nem deviamos perder tempo com isto.

    Angola é um país independente, deixem-nos matarem-se uns aos outros, quando tivermos de ir trabalhar para outra lado, vamos, eles continuam e ficarão sempre na miséria, enfim, sentados num barril de petróleo e, seguramente, a tomarem banho com ele…

    Por acaso, ao incógnito do dia, gostaria, mas gostaria mesmo, que um dia o mais velho, viesse à televisão, com a seguinte afirmação:

    – INFORMAMOS QUE OS ESTRANGEIROS (ATÉ OS DE CARTÃO DE RESIDENTE) VÃO TER DE SE AUSENTAR DO PAÍS DURANTE 30 DIAS, PARA FAZERMOS A CONTAGEM DA POPULAÇÃO NACIONAL; FINDO ESSE PERÍODO DE FÉRIAS, PODEM REGRESSAR À CONTADE, ESTARÁ TUDO NO SEU SITIO.

    Apostas?

    1ª semana: acabava o fornecimento de combustível, luz e água;
    2ª semana, começavam a faltar generos alimenticios;
    3ª semana: guerra civil generalizada…

  11. E atenção que eu até tive o cuidado de referir estrangeiros, não Portugueses…

    Daria para imaginar o cenário? não dá, mas que daria um certo gozo… daria

  12. Caro Anónimo,

    como está em Portugal talvez desconheça a realidade actual de Angola e os seus comentários são provenientes do típico orgulho angolano ferido e do recorrer ao passado tempo do colono.

    Não vou dizer que a colonização é uma coisa boa, seja de que país se trate. Mas se acha que 1975 foi bom, posso só citar uma frase que li num comentário a um artigo deste blog: “em 30 anos, Angola recuou 100!” Por exemplo, nos anos 70 a água canalizada era própria para consumo.

    A realidade actual que eu vejo é a de que o povo vive na miséria e contenta-se, é assim porque é assim… Muitos preferem viver de “arrumar” carros e pedir dinheiro a ter um emprego fixo.

    Quem cá está e quer que o país evolua, se retrata a realidade do país fere o orgulho angolano e depois recebe comentários destes em troca.

    Bom artigo Afonso, continua assim, abraço

  13. Desculpem jericos, mas ainda consegue haver pior que vós! Este calcinhas é um perfeito arraçado ordinário de jerico, porque ainda não viu que o livro que aqui trouxe, na sua habitual cultura de lombada, é um conjunto de textos de quarenta anos de trabalhos académicos dos dois autores, proibidos enquanto o tenebroso calcinhas andava no kinaxixe a insinuar-se como médico tentista, não passando de um vulgar Lulu Gouveia, ou talvez mesmo de um Zeca Diabo(Um protético).Ele como nada percebe peço-lhe que se retire porque palha já dei demais. Aos outros broncos e idiotas que aqui escrevem, resta-me ter pena deles. Acabaram mesmo em 1975, hoje não passam de escroques da memória.Não percebem nada de nada e o aerogramista do Cacém, ou de Queluz se fosse menos idiota talvez fosse um quadro util, assim é mais um idiota de um portugu~es, igual a Saão José Lopes, Carvalho das Barbas e Reis Ventura. Um paquiderme!

  14. Caro Afonso,

    Muito boa noite.

    Sendo leitor habitual do seu blogue, estou desapontado com a atitude de alguns “cidadãos” angolanos, que para além de desconhecerem a História do seu país, revelam falta de tacto, falta de civismo, falta de respeito e falta de carácter, escudando-se em apelidos para atacarem de forma desonesta e imbecil este blogue, o seu autor, Angola e Portugal.

    Espero que o pensamento emitido por este “cavalheiro” não seja comum em Angola, caso contrário a presença dos portugueses em Angola estará em risco a curto prazo.

    Com certeza ele esquece-se que as empresas portuguesas foram praticamente as únicas que ficaram em Angola depois de 1975, mesmo na pior fase da guerra civil Se o português fosse tão mau, não teria criado a mulata, não teria fundado lindas cidades em Angola como Luanda, Nova Lisboa, Benguela, Lobito…Se o português fosse mau, não teria deixado um país pleno de crescimento, de brilho, de orgulho, de esperança, de beleza às mãos de certas pessoas que se encarregaram de o rapinar, destruir e violentar da pior forma possível.

    O que é Angola hoje ? Um país com centenas de criança orfãs, que vivem na rua. Um país com hospitais na penúria, com milhares de cidadãos que passam fome, não têm trabalho,não têm esperança. Que dizer daquele arrumador que há cerca de 2,3 anos, foi espancado até à morte por seguranças do presidente angolano, apenas porque cantava um rap puco abonatório em relação ao poder???

    Claro que a colonização portuguesa não foi perfeita. Mas no fundo, não existiram colonizações perfeitas.Que dizer da colonização belga do Congo, da colonização francesa da Argélia????

    Que dizer da falta de escolas, condições mínimas de vida, num país que supostamente tem um partido “popular”…

    É esta a liberdada e independência que o Anónimo quer ??

    Fantástico, não haja dúvidas….

    Esperava um raciocínio mais inteligente da sua parte…

    Sinto-me cansado e triste com estas afirmações que mostram que afinal de contas os angolanos não gostam tanto de nós como dizem. Afinal de contas, só servimos para enviar dinheiro e ambulâncias…

    Caro Afonso, dou-lhe mais uma vez os parabéns. E continue assim. Afinal decontas, os bois falam, mas a caravana passa…

    Um abraço tropical de um português de Angola desiludido com os angolanos…

  15. Uma vez que está farto de nos aturar terei todo o gosto em não publicar os seus comentários, já que parece não ser capaz de resistir à tentação de nos vir visitar.

  16. A democracia da internet, e a democracia de um modo geral, dá azo a que indivíduos de capacidade mental diminuta tenham voz activa. É o problema das democracias, mas é um mal menor. Resta-nos o consolo de que se fossem tipos deste calibre a mandar em todo o lado estaríamos ainda na idade da pedra lascada.
    Felizmente que semelhante sumidade se fartou. Poupar-nos-á assim à leitura das sua porcarias.

  17. Parabéns Afonso, excelente artigo, um dos melhores que aqui li.

    É pena que seja assim, mas avaliando pelos comentários de alguns angolanos, não é dificil prever o caminho que os espera… é pena.

    Abraço

Deixe uma resposta

Nota: Os comentários apenas serão publicados após aprovação. Comentários mal-educados, insultuosos ou desenquadrados serão apagados de imediato.

« - »