Moleskine
Afonso Loureiro
Aprendi com um grande homem, o Eng.º Frias de Barros, que as anotações se fazem a caneta ou a lápis sem borracha por perto. Ao fazer observações, é demasiado fácil emendar para um valor errado um algarismo que nos pareça desajustado. Mais tarde descobrimos que a correcção não faz sentido, mas não nos conseguimos lembrar do valor antigo. Em caso de dúvida, risca-se o primeiro número e escreve-se ao lado o novo. Se tudo correr mal, o valor original ainda está legível. Os apontamentos não ficam tão bonitos, mas são mais úteis.
Para que as ideias de novos artigos não se perdessem, passei a andar com um bloco onde anoto frases soltas, parágrafos inteiros ou apenas tópicos interessantes. Esta memória de bolso recebe rabiscos a tinta, que são corrigidos e alterados com traços rápidos, para que a ideia original não se perca nas mudanças. Quando cumprem o seu propósito, a página é arrancada, deixando lugar para novas ideias. Não são agradáveis à vista, até porque a capa é quase sempre uma das primeiras vítimas do constante manuseamento.
Bloco usado e abusado
Há alguns meses ofereceram-me um novo bloco, com capa dura e elástico para o manter fechado. É um dos famosos Moleskine do imaginário de pintores e poetas melancólicos que se sentam na margem esquerda do Sena a contemplar a água escura.
Infelizmente, ainda não me atrevi a escrever-lhe uma única nota. Fico intimidado pelo seu aspecto severo de bloco que apenas aceita obras finais em vez de rabiscos descomprometidos. Sei que o papel é excelente para escrever e desenhar a lápis e não se desfaz com o uso repetido da borracha, mas, mesmo assim, sou incapaz de dar o primeiro passo. Na primeira página, o espaço onde deveria escrever o nome sobre a linha tracejada continua vazio. A minha caligrafia é demasiado feia para merecer tamanha honra.
Algum dia terei de perder o medo…
Concordo com você. Também me intimido com os moleskines. Ainda bem que temos os guardanapos de papel e os blogs para rascunho.
Penso que a intimidação deveria ser do Moleskine por poder receber nas suas páginas tão honrada caligrafia e escrita (mesmo apesar de dizeres que a caligrafia é feia).
Perde o medo, dá asas á tua imaginação e começa… o mal está em começar.
Terei todo o gosto em oferecer-te o próximo Moleskine quando terminares esse.
Agora fiquei curiosa: vou comprar um pra testar…
O que conta é o conteudo, não a forma do que la se colocar.