Coisa de pré-sinalização
Afonso Loureiro
O código de estrada angolano está uniformizado com o resto do mundo. As regras básicas são as mesmas, os sinais de trânsito parecidos com os europeus e os carros só podem circular se cumprirem uma série de requisitos. Pelo menos em papel é assim.
Em Angola é obrigatório ter espelhos e luzes a funcionar, mas são raros os carros que cumprem estas condições. Não é raro encontrar carros sem faróis sequer, ou porque foram roubados, ou porque caíram depois de um acidente. Os acidentes violentos são frequentes, mas não costuma morrer muita gente.
Toyota Harmónio
Também é obrigatório ter um triângulo de pré-sinalização de perigo devidamente homologado. A polícia é particularmente meticulosa quando verifica se os carros trazem um. Em caso de avaria, o que é frequente, serviria para avisar que o carro está parado na estrada, como se faz no resto do mundo. Mas Angola não é o resto do mundo e posso dizer que até agora só vi o triângulo ser usado quando se reboca um carro.
Com uma corda manhosa amarra-se o carro avariado ao reboque, habitualmente um carro ligeiro ou um candongueiro, e o passageiro do reboque vai com a mão de fora a segurar o triângulo sobre o tejadilho. Quem vai a frente sabe que ali segue um reboque e que não é boa ideia tentar furar a fila entre aqueles dois. Quem vai atrás e tem o azar do rebocado ser mais alto que o reboque, às vezes ultrapassa e depois não tem sítio onde se enfiar.
Quase não se partiram garrafas
Quando um carro avaria, o triângulo desaparece misteriosamente. No seu lugar, mas na posição regulamentar, coloca-se qualquer coisa. O objecto mais inusitado pode servir para sinalizar o perigo rodoviário.
Se um candongueiro tem um furo, arrasta o pneu para o meio da estrada, alguns metros atrás da Hiace. Até acabar a reparação, todos se desviam daquele obstáculo e, por consequência, da carrinha. Se a avaria é outra, procura-se uma pedra grande ou um pedaço de sucata para colocar na estrada. Nestes casos, quando a avaria é reparada, o carro arranca e a pedra fica, juntamente com todas as peças e desperdícios gerados pela reparação da avaria. Quem vier atrás que se amanhe.
No caminho de volta para Luanda, lá da visita à província de Benguela, apercebi-me de que tudo pode servir para sinalizar avarias. Nas estradas de província é mais vulgar ver um monte de ramos atrás de cada carro avariado. Um saltinho até à moita mais próxima com uma catana é muito melhor do que ir procurar o triângulo.
À noite, e como ainda não há moitas nem pedras retro-reflectoras em Angola, os condutores sinalizam as avarias com duas pequenas latas de parafina a arder. Mesmo nas estradas mais escuras é impossível não perceber que ali está um obstáculo.
No entanto, posso assegurar que estes métodos de pré-sinalização são muito mais eficazes. Já perdi o conto ao número de triângulos que vi serem atropelados por condutores distraídos. De um pedregulho toda a gente se desvia!
Há blocos de motor por todos os cantos
Acho que a polícia não devia ser tão rígida ao exigir, especificamente, um triângulo de pré-sinalização. Seria muito mais simples abrir a mala do carro e apresentar uma coisa de pré-sinalização!
Imaginação não falta… o perigo está sinalizado e com bastante originalidade.