Açambarcamento
Afonso Loureiro
O abastecimento de géneros é muito complicado em Angola. À excepção de alguns artigos, quase tudo o resto é importado. Anos de guerra criaram uma dependência atroz do exterior e das importações. Os produtos chegam às lojas apenas de tanto em tanto tempo. Isso faz com que nunca se saiba bem o que se pode comprar a dado momento.
Às vezes vamos ao Jumbo fazer compras para algumas semanas ou procurar algum produto que esteja demasiado caro no supermercado da esquina. Temos sempre surpresas. O que vimos encher corredores inteiros na visita anterior, agora está esgotado e não se sabe quando vem mais. Quando temos marcas concorrentes que possam substituir, não há problema, mas às vezes ficamos mesmo sem escolha.
O tecido industrial angolano, talvez por ainda estar a sair do tear, tem dificuldades em abastecer o mercado. Não é raro que marcas de manteiga ou iogurtes angolanos esgotem durante umas semanas. A água engarrafada nacional sofre do mesmo problema.
Produtos tradicionais, como o óleo de palma, têm de ser importados de Singapura porque a produção nacional não é suficiente.
Para a Muamba
Por isso, só há uma solução. Açambarcar. Sempre que se encontra um produto que se consome habitualmente, compra-se uma quantidade absurda. Não sabemos quando vai haver mais. É preciso ver as datas de validade e fazer umas contas de cabeça para ver se ainda vai estar bom quando se estiver a acabar este lote. Puxa-se o carrinho para perto da prateleira e atesta-se.
Lacticínios
Mesmo os produtos que se compram de mês a mês podem estar muito tempo esgotados, por isso é bom ter reservas…
Em duplicado e triplicado
Como toda a gente o faz, os produtos esgotam-se cada vez mais depressa. Quanto mais se importa, mais se açambarca. É um ciclo vicioso, mas é assim que funciona…
Nas lojas, quase todos os produtos frescos são muito caros. É normal encontrar tomates a 10€ por kilo. São tomates importados que chegaram a Angola em contentores refrigerados. Na terra do marisco pode-se comprar camarão congelado, de baixa qualidade, a preço de lagosta fresca na Europa…
Para os congelados não temos muita escolha. Até nas ruas vemos vender frango congelado importado. Para os hortícolas, já descobrimos que em vez de reclamar do preço, mais vale ir directamente à fonte. Vamos às lavras ou às bancas fora do centro e compramos tomates, batatas e fruta a preços quase angolanos.
As zungueiras, que é o nome que se dá às vendedoras ambulantes, costumam abastecer-se nos arrabaldes de Luanda. Aproveitamos as escapadelas para fora do bulício da cidade e fazemos o mesmo. Às vezes somos surpreendidos. Quando estamos dispostos a regatear até aos 500 Kz por um balde de tomates que custaria 800 Kz perto do centro, supondo que nos vão pedir 600 Kz, propõem-nos apenas 400 Kz. Ficamos desarmados. Acabamos por levar muito mais coisas que o previsto, mas gastamos menos. Ficamos contentes por ter sido a um preço justo e, especialmente, porque o dinheiro foi para as gentes da terra e não para a empresa estrangeira.
Mãe Lucinda
Como a escassez de balanças é semelhante à de todos os outros produtos, as transacções fazem-se em unidades de volume. Para batatas, cebolas, tomates e similares, a unidade básica é o balde. Costumam ter cerca de cinco litros de capacidade. Para não haver dúvidas quanto até onde se enche o balde, tem de ficar cogulo. Não se pode lá meter mais nada. É claro que a vendedora hábil já sabe como há-de empilhar os géneros para poupar um ou dois por balde.
Se um balde for muito, faz-se uma pilha com quatro ou cinco unidades. A fruta costuma ser vendida assim.
A unidade é a pilha
A maioria dos produtos é de produção própria ou comprada nos mercados de província. Geralmente têm bom aspecto. Quase sempre melhor que os das coisas do supermercado. Somos fãs!
Para além das aventuras culinárias, também estás a aventurar-te na arte do regateio ( o açambarcamento não comento – na terra onde assistires, farás como vires). O estágio na Tunísia parece ter ajudado.
Quando voltares tens de mostrar esses dotes culinários, até agora só os olhos comeram e ficou água na boca. É preciso precaver inundacões!….
Boas compras e bom proveito.
Beijocas
Por cá (ainda) não é usual este procedimento… mas recordo-me que há uns meses atrás as prateleiras dos supermercados estavam vazias e muitos tentaram precaver-se açambarcando o máximo, pois não se sabia quando iria haver mais… esperemos que não se repita.
muito original, continua assim! fazendo mais propaganda da nossa terra e o que temos para oferecer ao mundo todo, só nós resta um Partido, politico, engenheiro, seja la o que for, para dar uma boa imagem do nosso sector Primário, e deixe-mos de receios e apostemos mais na agricultura o que só temos a ganhar.. abraços!!
É mesmo na agricultura que se vai ver o desenvolvimento do país. Não se pode contar só com o petróleo que não se come acaba por ir forrar os bolsos a muito poucos.