Falta menos um dia
Afonso Loureiro
Ser emigrante é mau. Não há volta a dar.
Por uma razão ou por outra, o que procuramos não existe na terra onde crescemos e onde temos as nossas referências. Com todos os defeitos que tem, não deixa de ser o sítio onde nos sentimos melhor. Um dia descobrimos que o sonho dos nossos pais de uma vida melhor para os filhos, sem a emigração que marcou a geração dos avós, está cada vez mais longe.
Em muitos aspectos, tenho uma vida infinitamente melhor que a dos meus pais, sem tantos sacrifícios e privações. Mas nem tudo são rosas. Talvez por termos expectativas mais elevadas ou porque a sociedade assim o obriga, é cada vez mais difícil começar a vida. Há duas gerações, seria inconcebível viver em casa dos pais com trinta anos. Actualmente, é habitual.
Seguindo o exemplo de tantos outros, emigrei. Em Angola usa-se o eufemismo de expatriado. Vim fazer coisas que há muito estão feitas em Portugal e não escondo que vim ganhar mais do que ganharia lá. Para níveis de Angola, talvez ganhe uma obscenidade, mas antes que me acusem de explorador, aviso desde já que não há muitos na minha área. A lei do mercado funciona e, quando a oferta é pequena, o preço sobe. Parte das minhas funções é formar um quadro angolano para me substituir no final do contrato. Creio que é uma contrapartida mais que justa.
O pior da vida de emigrante é a distância à família. Todos os que amamos ficam para trás e os dias custam a passar. O alento de que se prepara um futuro melhor graças ao sacrifício nem sempre é capaz de afastar as dúvidas ou o desânimo. As pequenas coisas que tomávamos como garantidas estão a meio mundo de distância e até mesmo os gestos que automatizámos durante toda a vida estão desajustados. Um ano depois de chegar a Angola e ainda acordo a estranhar a cama…
E o tempo, apesar de andar a velocidades estranhas neste hemisfério, com as Sextas a surgir logo a seguir às Terças, parece que nunca mais passa. Os poucos meses que faltam para o regresso começam a ser medidos em semanas e depois dias, fazendo números que decrescem cada vez mais devagar. Nas pausas do trabalho, não temos como evitá-lo, pensamos em tudo quanto não estamos a viver, nas mãos à volta da cintura, no passo certo a pensar no tango, dos olhares silenciosos que trocamos e agora reduzidos a uma imagem desfocada no ecrã. Vamo-nos iludindo, dizendo que falta menos um dia para o regresso. Às vezes achamos que foi apenas mais um dia longe…
Sim passamos alguns dias longe (foram muitos sim), mas falta cada vez menos para o teu regresso.
Foi um ano duro, mas construimos muita coisa que doutra maneira não poderíamos ter como hoje temos,com muito sacrifício de ambos, claro… mas o futuro está cada vez mais próximo.
Tenho muito orgulho em ti e sei que o sacrificio que fazes é muito grande, por isso e por tudo, só te posso dizer
AMO-TE!
Desta vez, temos mesmo de ir beber um copo, até para esquecer as “gasosas”.
Estamos à tua espera.
Caro conterraneo,
Não posso deixar de comentar este texto.
Revejo-me totalmente nas suas palavras.
Tenho acompanhado assiduamente o desenrolar do blogue e penso que está cada vez mais interessante.
Talvez nos encontremos por Luanda num desses infindaveis engarrafamentos…
Bem haja!
Abraço Luso
Pedro